Terra de todos

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Raquel de Medeiros

Em nação miscigenada como a brasileira, parece contraditório haver movimentos racistas e a necessidade de lutar pelos direitos de negros, índios e orientais. Porém, ainda há quem sobreponha ao caráter, talento e dignidade características como gênero sexual, poder aquisitivo ou cor da pele. Para incentivar o respeito aos afrodescendentes, o Dia da Consciência Negra passou a ser celebrado em 20 de novembro para nos fazer refletir sobre as formas de discriminação que persistem em diversos segmentos da sociedade verde-amarela. Conheça a seguir três cidadãos que dedicam seus dias e noites pela causa negra no Grande ABC. 


Dojival Vieira fundou a ONG ABC sem Racismo Foto: Nario Barbosa
SEM DESCANSO
Lutador social desde o fim dos anos 1970, o jornalista Dojival Vieira fundou em 2004 a ONG ABC sem Racismo, em São Bernardo, na primeira Semana da Consciência Negra celebrada no município. Com ela, surgiu também a agência de comunicação Afropress, de produção de conteúdo jornalístico focado na temática étnico-racial brasileira. O motivo desse engajamento? Para Dojival, a região – que liderou a luta pela redemocratização do País – não foi capaz de enfrentar a desigualdade provocada pela escravidão.
 
Além disso, Dojival afirma que já sentiu na pele o preconceito e acha justo existir uma espécie de ‘acerto de contas’ aos descendentes de africanos no Brasil. “É necessário garantir à população negro-mestiça brasileira o acesso aos direitos básicos da cidadania.” A luta de Dojival já rendeu, segundo ele, consequências difíceis, como ameaças por parte de pessoas com crenças racistas e neonazistas. “Ameaças de morte a mim e aos jornalistas, incluindo membros da minha família, foram feitas por esses grupos delinquentes.
 
Sempre nos mantivemos firmes e fiéis ao nosso compromisso de fazer  jornalismo com foco nesse tema, porque sabemos que informação é poder.” O grande objetivo de Dojival é um Brasil em que todos possam viver com igualdade de oportunidades e que cada um vença pelo seu esforço, dedicação e talento. “Luto por um Brasil com inclusão, com democracia, igualdade de direitos e de oportunidades, em que ninguém seja julgado pela cor da pele, como dizia Martin Luther King, mas pelo seu caráter.”

ABAIXO O PRECONCEITO
Wilson Roberto Levy, 59 anos, começou a sentir vontade de se envolver na luta pelo direito dos afrodescendentes depois que passou por experiências desagradáveis durante a infância e a adolescência. Chegou a sofrer bullying e racismo na escola, mas na época nem sabia o que eram. Durante jogo de futebol, foi xingado por um dos alunos do colégio e ainda levou advertência do diretor, que não compreendeu a situação. Wilson também ficou indignado com uma notícia dizendo que três jovens atletas do Clube Regatas Tietê haviam sido impedidos de entrar na área social do estabelecimento apenas por serem negros.
 
Com vontade de fazer algo em prol de uma mudança na mentalidade das pessoas, passou a se envolver em movimentos a favor da causa negra e a ministrar palestras. Em 1993, mudou-se para Diadema a fim de ficar mais perto da comunidade. Atualmente, faz parte do Fórum de Entidades Negras da cidade e é dirigente da Zulu Nation Brasil, que oferece aos jovens da região oficinas sobre a cultura hip hop, como grafite e cursos de DJ.  “É uma entidade cultural e educacional que proporciona atividades nas escolas também. No semestre passado, levamos, junto com a Prefeitura, a história do afro-brasileiro no País para as crianças de 1ª e 2ª séries.” Wilson diz que a luta não é contra outras raças, mas contra uma desigualdade racial e social que leva as pessoas a serem marcadas. A solução, ele tem: “Uma sociedade mais justa e sem racismo tem de começar da base, com a educação”.

Rosana Silva acredita que o País está em evolução Foto: Claudinei Plaza
FAZENDO A DIFERENÇA
A professora Rosana Aparecida da Silva, 45 anos, de Santo André, é mais uma batalhadora em prol das causas negras na região. O que a motivou foi a sensação de inconformismo em relação à forma como os afro-descendentes são tratados. Iniciou trabalho no Movimento de Mulheres Negras de Santo André e depois ajudou a fundar a ONG Negra Sim, onde passa conhecimento a grupo de mulheres que repassam o que aprenderam a familiares e amigos. “Minhas ações demonstram um querer, uma determinação em transformar o meu espaço.” 
 
Rosana acredita que o País já evoluiu, o preconceito melhorou um pouco, mas ainda há muito o que se fazer. “O mercado de trabalho define bem essa questão. A saber: os homens negros recebem menos do que mulheres e homens brancos”, destaca. A professora sonha com o fim da segregação e também cita trecho de Martin Luther King para expressar o que almeja: “Tenho o sonho de que as pessoas vão, um dia, viver em uma nação onde não serão julgadas pela cor da pele, mas pelo conteúdo de seu caráter.”



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