Genebra rende-se a Rousseau

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Heloísa Cestari

Rousseau viveu na cidade suíça até os 16 anos
Para Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), o homem é bom por natureza. A sociedade é que o corrompe. Com essa filosofia, o suíço criticou a sociedade de vários locais. A começar pela cidade onde nasceu e viveu até os 16 anos: Genebra, que chegou a queimar seus livros em frente à Prefeitura e condená-lo ao exílio em 1762, após a publicação do revolucionário tratado de educação Émile. Para dar o troco, o filósofo abdicou da cidadania genebriana. Agora, a terra dos relógios, das contas bancárias sigilosas e das principais organizações humanitárias internacionais faz as pazes com sua história realizando uma série de eventos em homenagem aos 300 anos de nascimento do mais romântico iluminista. 
 
Exposições, espetáculos, concertos, filmes, passeios e conferências fazem parte da programação 2012 Rousseau Para Todos, que será encerrada com uma grande cerimônia no Parc de la Grange no dia do aniversário do ilustre pensador, nascido em 28 de junho de 1712 no número 40 da Grand-Rue de Genebra, onde hoje funciona um museu.
A ideologia de Rousseau será discutida na Universidade de Genebra e analisada na exposição Vivant ou Mort, il les inquiétera toujours (na tradução, Vivo ou Morto, Ele Sempre os Preocupará). O presidente da Sociedade Jean-Jacques Rousseau de Genebra e curador da mostra, Alain Grosrichard, justifica o título lembrando que, ainda hoje, as ideias do filósofo nos tiram o sono porque o materialismo que ele tanto criticou também causa mal-estar na sociedade atual. 
 
Essa inquietação promete inspirar também os jovens cineastas responsáveis pela mostra de curtas A Culpa É de Rousseau, sob direção de Pierre Maillard, que abordará temas como amor, educação, desigualdade social e natureza, na visão do escritor, aplicadas à realidade atual. Os vídeos serão exibidos na Ilha Rousseau, que concentrará grande parte das festividades. Segundo o diretor da programação, François Jacob, Rousseau ajudou a construir a base intelectual da sociedade em que vivemos, sobretudo em nível político.
 
Genebra terá programação em homenagem ao filósofo
E outras celebrações se estenderão até fim do ano para ilustrar a obra deste filósofo, escritor, pedagogo e crítico social que se atrevia a viajar pela Europa e escrever sobre os mais diversos assuntos com um misto de ingenuidade e malícia que até hoje instiga quem se dispõe a pensar sob sua ótica. Um dos eventos mais esperados é a ópera JJR Cidadão de Genebra, que será apresentada no Grande Teatro da cidade entre os dias 9 e 24 de setembro. 
Também estão previstos espetáculos de música clássica, ópera com marionetes, passeios guiados na companhia da cantora Stephan Eicher e exposições que revelam as facetas de Rousseau como músico, botânico, relojoeiro, educador e até sobre as farpas trocadas com Voltaire e outros contemporâneos. A agenda completa pode ser conferida no site www.rousseau2012.ch.
 
Filho e neto de relojoeiros, Rousseau perdeu a mãe dias após o parto e teve de afastar-se do pai ainda criança. Preterido na Suíça, ganhou fama entre a elite parisiense com suas críticas que atingiam desde o cenário político até os costumes morais e religiosos. “Quanto mais do mundo vi, menos pude moldar-me à sua maneira”, disse ele um dia. Acabou sendo perseguido também na França e refugiando-se mais tarde na Inglaterra, a convite do filósofo David Hume. 
No fim da vida, dedicou-se à botânica, não só porque gostava de plantas como também para se afastar do mundo que tanto o repudiava. E que agora o exalta. Além da Suíça, eventos em comemoração ao tricentenário do pensador serão promovidos em Washington, Nova York, São Paulo, Bohicon, São Petersburgo e até em grandes centros asiáticos, a exemplo de Tóquio e Istambul. É só conferir as programações, arrumar as malas e deixar o pensamento voar longe. Afinal, como também disse Rousseau, “caminhar com tempo, em uma terra bonita, sem pressa, e ter por fim da caminhada um objetivo agradável é, de todas as maneiras de viver, a que mais agrada”.



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