Hora de ser mãe

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Raquel de Medeiros

Até a década de 1960 não havia garota que não acreditasse que o bom da vida – ou, pelo menos, o correto – era encontrar um homem bem-sucedido, casar e ter filhos. Muitas engravidavam logo nos primeiros meses após o matrimônio. Mas os tempos se transformaram e a cabeça feminina também. As mulheres passaram a estudar mais, lutar por igualdade de direitos e a exercer profissões antes só desempenhadas por homens. “Abriram-se vários caminhos, antes proibidos ou quase impossíveis para as mulheres”, diz a antropóloga Mirian Goldenberg, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. E elas mudaram em muitos aspectos.
 
Na ânsia por conquistar a independência econômica, o trabalho passou a ocupar o topo da lista de prioridades femininas. E o resultado reflete-se nos números IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A quantidade de mulheres que se tornaram mães com mais de 40 anos cresceu 27% entre 1991 e 2000. A gravidez tardia é tendência no Brasil. Principalmente entre a população inserida no mercado de trabalho. É a priorização da carreira em detrimento da formação de uma nova família. O Hospital das Clínicas de São Paulo também registrou crescimento nos atendimentos de gestações tardias. O índice saltou de 5%, na década de 1970, para 16,6%. A escolaridade é um dos condicionantes desse comportamento, já que as mulheres com até sete anos de estudo têm, em média, três filhos a partir dos 25 anos e as com nível superior, apenas um rebento a partir dos 28 anos. 
 
Em geral, as pessoas estão mais aptas a refletir sobre seus reais interesses e não a apenas seguir um padrão. Para Mirian, o futuro reserva uma sociedade ainda mais flexível, onde algumas mulheres irão perceber que não foram feitas para ter filhos e optarão por não se tornarem mães sem nenhum complexo. Além disso, a previsão é de que haja cada vez mais homens e mulheres vivendo sozinhos ou em múltiplos arranjos conjugais. “Haverá mais liberdade e, possivelmente, escolhas mais satisfatórias, para homens e mulheres.” Mas e quando se descobre que o sonho da maternidade é algo sólido e, talvez, tarde demais para ser concretizado?

RISCOS 
 
A atriz Solange Couto foi mãe novamente aos 54 anos
Uma mulher saudável de 30 anos tem apenas 20% de chance de conceber a cada mês. Aos 40 anos, esse percentual cai para 5%. Geneticamente, o corpo começa a apresentar dificuldade para fecundação sadia a partir dos 35 anos. “Há piora no padrão ovulatório e menor possibilidade de a gravidez ocorrer. Isso fica mais acentuado a partir dos 40 anos”, afirma o diretor da maternidade do Hospital Samaritano, em São Paulo, Edilson Ogeda. 
 
Obstetricamente, 30 anos já é o limite. “A mulher que engravida após os 30 corre mais riscos de ter pressão alta e diabetes durante o pré-natal. Nessa idade a mulher é considerada idosa e a gravidez, de alto risco”, diz o ginecologista e especialista em reprodução humana Raul Nakano, dono de uma clínica de fertilização na Capital. Mesmo assim, um mapeamento feito pelo site Delas mostra que 12 mulheres com mais de 40 anos viram mães no País todos os dias.
 
Na opinião de Nakano, hoje as mulheres querem tempo para se desenvolver profissionalmente, viajar, curtir um relacionamento sem pressão, porém, o corpo continua funcionando igual às décadas passadas. Segundo o especialista, biologicamente o organismo humano atinge a plenitude na terceira década de vida. “Socialmente, as mulheres estão protelando a formação da família para depois dos 30, mas biologicamente o bom é antes dos 30. Melhor ainda se for entre 22 e 26 anos.”
 
O problema é que, assim como o corpo, os óvulos envelhecem, perdendo qualidade e potência. “O conselho que dou é não deixar para depois dos 37”, adverte o médico. “É após essa idade que há maior risco de infertilidade. É como comprar uma pilha e deixá-la guardada por alguns anos: a qualidade não será a mesma.” A solução em alguns casos surge através do auxílio da medicina, como a fertilização e inseminação artificial, entre outros métodos.
 
As mamães tardias também correm mais risco de enfrentar síndromes hipertensivas, diabete gestacional e aborto. “O agravamento da hipertensão ou do diabete pode fazer com que tenhamos de antecipar o parto, trazendo ao mundo um bebê que pode sofrer as consequências da prematuridade”, diz Ogeda. A criança ainda pode apresentar alterações cromossômicas como as síndromes de Down, Edwards ou Patau. Segundo o especialista, enquanto aos 35 anos o risco de uma gravidez comprometida é de uma para 500 gestações, aos 40 este índice sobe para uma a cada 120, aproximadamente.
 
Quem já passou da boa fase para engravidar e mesmo assim quer gerar filhos deve investir em exames específicos que ajudem a prevenir futuros problemas para a mãe e o bebê, proporcionando um parto mais tranquilo. O ecocardiodoppler colorido do coração do bebê, por exemplo, se realizado durante a 26ª semana de gravidez, pode acusar cardiopatias. Para observar riscos de alterações cromossômicas, especialistas sugerem exames mais invasivos, como a biópsia de vilo corial, a amniocentese ou a cordocentese.

CABEÇA DE GRÁVIDA
 
Se o corpo dá prazo de validade para que a mulher se torne mãe, a cabeça trabalha em sentido oposto. É com o tempo que as habilidades vão sendo desenvolvidas e solidificadas. Para a mente, o momento certo da maternidade é relativo. “Não acredito que haja uma melhor idade para isso, mas sim a ocasião em que a mulher deseja vivenciar essa experiência e se sente pronta para ela”, explica a psicóloga Luciana Leis.  Se as mães jovens podem ter mais energia para educar por um lado, por outro a instabilidade financeira exige que trabalhem mais e abdiquem do tempo dedicado à família. As mulheres mais velhas contam com a vantagem de ter mais tempo e experiência de sobra.  
 
A atriz Solange Couto, 55 anos, passou pelas duas fases da maternidade e acredita estar mais envolvida agora. “Infelizmente, antes eu não


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