Talento via exportação

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Sérgio Vieira

Andrea Iseki
Silvio foi presidente do IBGE

Sabe aquele momento de definição da nossa formação, quando, perto de escolher o curso universitário, sonhamos em dedicar horas de estudo àquilo que poderá ser nossa atividade principal no futuro? Difícil não ter algum adolescente que não vislumbre a intenção de viver daquilo que elegeu como profissão.

Mas, definitivamente, esse não é o caso de Silvio Minciotti. Por vontade própria, teria sido advogado. Tinha paixão – e ainda tem, reconhece – pelo exercício do Direito. Só que a vida do reitor da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul), 64 anos, mestre e doutor em Administração, deu uma guinada justamente nessa fase. No melhor estilo ‘deixa a vida me levar’, Minciotti literalmente foi conduzido pelas circunstâncias. “O máximo que fiz foi pisar no acelerador. No volante foram poucas vezes.”

E se apaixonou por aquilo que o destino o reservou. Achou que teria dificuldades financeiras de se estabelecer na profissão caso cursasse Direito. Recém-concluído o curso de Química no Mackenzie, em 1967, recusou um convite minutos antes de iniciar o trabalho. Recebeu outra proposta e deu início à área que iria nortear toda a sua carreira: administração e marketing.

Estava, então, decidida a trilha que iria seguir. Foi inscrito pela sua então namoradora – hoje mulher, Leila, com quem é casado há 42 anos – em 1968, na primeira turma de Administração do antigo Imes (Instituto Municipal de Ensino Superior), hoje USCS. O advogado frustrado e químico recém-formado havia se encontrado. Assim que se formou, começou a dar aulas na instituição de São Caetano e não parou mais.

Em 1981, veio a oportunidade de assumir a direção-geral do Imes, cargo máximo da instituição. No ano seguinte, veio a grande sacada que, por ironia do destino, acabou sendo responsável pela sua saída dos corredores acadêmicos para voos bem mais altos: criou o hoje premiado Inpes (Instituto de Pesquisas do Imes), referência em pesquisas socioeconômicas na região. Uma das mais importantes foi a análise sobre o mercado de telefonia móvel no Brasil, muitos anos antes de se falar em privatização e da universalização dos aparelhinhos telefônicos. O trabalho em uma pequena sala no prédio da faculdade começou a reverberar. Já se falava do Inpes fora do Grande ABC.

Professor também na Universidade de São Paulo, conheceu o então consultor empresarial Alexis Stepanenko, com quem manteve amizade. Em mais uma reviravolta, Alexis tornou-se ministro do Planejamento do governo Itamar Franco, em 1993. Não deu tempo de o professor de São Caetano lhe telefonar para cumprimentá-lo pela nova função. O agora ministro o procurou antes. E com um convite que fez Minciotti quase cair da cadeira: o chamou para assumir a presidência do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), um dos órgãos de pesquisa mais respeitados do mundo. De cara, recusou. Depois, naturalmente, não resistiu. “Nem sabia direito o que era o IBGE do ponto de vista administrativo. Estávamos falando de 12 mil funcionários e uma quantidade enorme de pesquisas”, lembra.

Para se ter ideia do gigantesco desafio de Minciotti, o orçamento do IBGE na ocasião representava quase que três vezes o da Prefeitura de São Caetano. No dia seguinte já estava em Brasília para se preparar para a posse de Alexis e dele próprio. Foi o único momento em que teve contato direto com Itamar. O pedido do novo ministro era que Minciotti implementasse no IBGE o que estava sendo feito no Inpes. Era necessário trabalhar na venda das pesquisas e mudar a cultura do órgão. Comprou uma difícil briga. Transferiu-se para o Rio de Janeiro e viveu por algum tempo na ponte aérea entre a capital carioca e Brasília. Voltava para São Caetano aos fins de semana.

Com dificuldade em deixar claro seu importante papel na administração federal pós-impeachment, o professor reconhece, após alguma insistência, que teve participação na implementação do Plano Real, principal vitrine para a eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência, em 2004. “Expliquei que era necessário resgatar a noção de valor do brasileiro. Para isso, ele precisava de um tempo. E daí surgiu a URV (Unidade Real de Valor), que deu origem ao real. Levantei esse problema e essa discussão acabou avançando.”

Foi lá, no IBGE, que ele descobriu o significado da política propriamente dita. Por conta disso, sua posse chegou a ser ameaçada. “Na noite anterior, houve uma discussão, que só soube bem depois, envolvendo o Alexis e o Henrique Hargreaves, então chefe da Casa Civil, que queria um nome ligado a ele no IBGE. No fim, prevaleceu a vontade do ministro do Planejamento”.

Lembra que, quando entrou no prédio da instituição, foi questionado por funcionários, que estavam em greve, sobre qual corrente política ele pertencia. “Disse que tinha sido convidado pelo ministro. Eles não entenderam que não havia ali uma indicação de deputado ou senador. O líder do movimento disse, sem constrangimento, que com a minha entrada eles estavam fritos.” Sem entender, Minciotti pediu que fossem mais objetivos. E eles foram: “Se o senhor não tem um padrinho político, a quem vamos procurar para defender nossas causas? Aquilo era de uma limpidez e eu não tinha me dado conta disso. O suporte político era fundamental.”

Tomou gosto pela política e entendeu como funcionava a engrenagem na sua gestão, quando teve de atuar diretamente para derrubar movimento que falava no fim do IBGE. Com boas argumentações, conversou muito com líderes de partidos e enterrou a ideia. Nessa peregrinação pelos gabinetes, aproximou-se do então líder do PSDB no Senado, Mário Covas.

A boa relação com o tucano seguiu-se a ponto de ingressar no partido e tentar cadeira de deputado federal em 1994. Faltaram-lhe 3.000 votos, mas sobrou a admiração do recém-eleito governador de São Paulo.

Fez a segunda volta para a USCS, que durou pouco. Foi convidado para assumir o Emplasa (Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano). “Recusei. Entendia que tinha de voltar para minhas origens. Só a lembrança já me deixava feliz. E não queria prêmio de consolação.” Recebeu outro contato. Desta vez do governador. E o convite era outro: assumir a Fepasa (Ferrovia Paulista SA). Não teve como escapar. E o argumento foi o mesmo: fazer na Fepasa o que ele havia iniciado no IBGE. Ou seja,



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