Duas caras

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Miriam Gimenes

Psicopatas são inteligentes, sedutores e podem dar um xeque-mate a quem não percebe suas artimanhas. Foto: sxc.hu

Tereza Cristina povoa o imaginário do telespectador como mais uma personagem de ficção. As atitudes da vilã da novela Fina Estampa, interpretada pela atriz Christiane Torloni, constrói imagem distante do ser humano comum. Fria e calculista, ela planeja meticulosamente – sempre com um quê de sarcasmo – a vingança aos inimigos, que brotam em sua vida diariamente. De tão cruel, chega a ser inimaginável. Mas não se engane: embora seja uma criação fantasiosa, Terezas Cristinas existem aos montes na vida real. É claro que nem todas, ou todos, chegam às vias de fato como a perua global, mas quem analisar seu modus operandi corre o risco de perceber que está, literalmente, ‘dormindo com o inimigo’. Ou melhor: com um psicopata.

Dizem que novela imita a vida real e vice-versa. Não importa. Assim como nos folhetins, o que não faltam são casos de psicopatia. E não pense que isso só acontece em outro Estado ou país. O Grande ABC assistiu há três anos ao trágico assassinato da estudante Eloá Pimentel, que foi mantida em cárcere privado durante cinco dias pelo ex-namorado Lindemberg Alves antes de morrer com um tiro na cabeça. O algoz, que será julgado neste mês, assim como Tereza Cristina, tinha todos os traços que levam a um diagnóstico de psicose: gostava de ser chamado de ‘príncipe do gueto’, era dominador, mentia e por nenhum momento sentiu dó da moça que dizia amar. 
Indivíduos que sofrem do distúrbio de personalidade antissocial – que é subdividido em leve, moderado e grave – são autores de ações inacreditáveis. “Total ausência de sentimento de culpa, arrependimento ou remorso pelo que faz de errado. Falta de empatia com o outro e emoções de modo geral (amor, tristeza, medo, compaixão). Frios e calculistas, mentirosos e contumazes, egocêntricos, megalômanos, parasitas, manipuladores, impulsivos, inescrupulosos, irresponsáveis, transgressores de regras sociais, violentos e só visam os próprios interesses”, define com propriedade a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, autora do livro Mentes Perigosas – O Psicopata Mora ao Lado. 
A classificação norte-americana de transtornos mentais aponta que 4% da população mundial têm esse caráter (ou falta dele). Do total, 75% são homens e 25%, mulheres. E não há explicação sobre a diferença entre o gêneros. Uma boa notícia em relação ao percentual – se é que existe – é que o grupo que apresenta psicopatias leves é maioria. A má? A minoria pode estar inserida entre os governantes da cidade, na sua equipe de trabalho ou até mesmo entre os familiares. “Eles podem arruinar empresas, destruir lares, dar ‘rasteiras’ nos colegas de trabalho, promover-se à custa dos outros, mas não sujam suas mãos de sangue”, alerta a especialista. A tática inicial deles é demonstrar ser uma pessoa de bem e, assim, quase sempre conseguem o que querem. 
A atriz global Suzana Vieira, em entrevista ao programa português Alta Definição, em 2010, deu a seguinte declaração: “Você convive com psicopatas sem saber. Eu era vítima de um psicopata. Espero não encontrar outro.” Ela se referia ao ex-marido Marcelo Silva, com quem conviveu durante anos entre idas e vindas. O ex-policial, que morreu em 2008 em decorrência de overdose, extorquiu a atriz e chegou a ameaçá-la com um suposto vídeo íntimo. Como se nota, todo cuidado é pouco: o perigo pode estar ao lado.
 
Maníaco do Parque, de Diadema, seduzia mulheres com falsas promessas e depois as matava. 
PERFIL EM POTENCIAL
É bom deixar claro que psicopatia não é sinônimo de loucura. Qualquer ato insano é leigamente atribuído ao transtorno, o que não confere com a realidade. Esses indivíduos, ao contrário de um esquizofrênico, têm a real consciência do que fazem e pior: sentem prazer em praticar o mal a quem quer que seja. “Eles estão infiltrados em todos os meios sociais, credos, culturas, e são capazes de passar por cima de qualquer pessoa apenas para satisfazer seus sórdidos interesses”, ressalta Ana Beatriz.
Um dos mais conhecidos nacionalmente, que também cultivou suas maldades na região, em Diadema, foi Francisco Assis Pereira, mais conhecido como Maníaco do Parque. O motoboy, que seduzia as mulheres com a falsa promessa de caça-talentos de uma agência de modelos, praticou 12 assassinatos – mas só admitiu nove. Após abusar sexualmente das vítimas, praticava atrocidades até acabar com a vida delas. Conclusão de seu laudo após ser preso? Psicopata. 
Embora ele faça parte da minoria, visto que grande parcela não é do tipo que comete perversidades, é bom munir-se de informações para saber como identificá-los, independente de qual grupo pertença. Se conhecer alguém que não expressa reação ao ver uma cena de morte ou acidente; que mente de forma exagerada todos os dias; que ri da desgraça alheia; gosta de ver o outro sofrendo ou, vez por outra, manifesta a intenção de praticar maldades, essa pessoa tem tudo para ter um laudo igual ao de Francisco. 
Até médicos, que já estão acostumados com todas as artimanhas de quem tem esse tipo de transtorno, podem cair na lábia. Eles são mestres em engabelar, encenar; são atores da vida real. Caso desconfie de uma pessoa, inclusive se convive diariamente com ela, cheque as informações dadas acerca de sua vida pessoal, a veracidade das histórias que conta e fique muito atento ao jogo do coitadinho. Todos usam, em algum momento, essa máscara para conseguir o que querem. 
Por isso, suas vítimas em potencial são aquelas personalidades generosas, as boazinhas. “Eles se aproveitam de mulheres quase sempre muito bem colocadas profissionalmente, prometem mundos e fundos, enfim, ganham a confiança da vítima. Quando menos se espera, o impostor pede dinheiro para completar a compra de um imóvel ou de um carro, e promete pagar


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