O direito de ser gente

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Heloisa Cestari

Crianças tratadas como adultos e sexagenários tratados como bebês. Neste mês em que se celebra o Dia Internacional do Idoso (1º de outubro) e o Dia da Criança (12), vale a reflexão: que valores têm prevalecido na relação entre gerações? Qual voz tem ecoado mais alto: a da experiência ou a dos caprichos infantis? Em ambos os casos, percebe-se a ausência de uma palavra: respeito.

 

Respeito à infância, roubada de muitas crianças que, em tenra idade, se veem obrigadas a trocar a boneca ou o carrinho pela enxada, pela mendicância, pela exploração sexual. Respeito ao direito que elas têm à Educação, não só na escola como em casa. Direito de ouvir ‘nãos’ da boca dos pais para que, no futuro, a vida lhe garanta mais ‘sins’. Direito de aprender as diferenças entre o certo e o errado; entre o lazer e o dever; de aprender a lidar com frustrações; de expor sua opinião e ter equilíbrio suficiente para respeitar a opinião do outro. Direito, enfim, de serem cidadãos de fato.

 

Crianças tiranas, que ditam os rumos do lar, serão adultos intolerantes, inconvenientes, mal amados e incapazes de lidar com chefes ou encarar divergências no trabalho. Em suma, as crianças ‘fortes’ (leia-se autoritárias) de hoje serão os adultos fracos de amanhã, que penderão às drogas, à insatisfação e à infelicidade diante da primeira adversidade que encontrarem pelo caminho. Serão crianças criadas para dar trabalho à sociedade ao invés de trabalharem por um mundo melhor.

 

E essa responsabilidade não pode ser despejada somente nas costas de educadores. No último dia 22, um menino de 10 anos disparou contra a professora Rosileide Queirós de Oliveira, 38 anos, dentro de uma sala de aula da Escola Municipal Professora Alcina Dantas Feijão, em São Caetano, diante de 25 alunos. Em seguida, atirou contra a própria cabeça usando o revólver calibre 38 que pegou escondido do pai, um guarda-civil municipal.

 

Poucos dias antes dessa tragédia,  uma idosa de 82 anos morreu atropelada por um jovem alcoolizado que saía de uma festa da Tusca (Taça Universitária Federal de São Carlos). A infantocracia dos anos 1990 começa a mostrar seus desastrosos resultados...

 

Na outra ponta, idosos vivem à margem social, tratados como bebês por pessoas dispostas a tudo para não envelhecer. Não só por questões estéticas, mas porque ser velho no Brasil dá medo. É sinônimo de desprestígio social, bem diferente do que se vê nos países do Oriente, onde os mais velhos dão sempre a última palavra.

 

Tanto crianças quanto adultos têm estatutos que lhes asseguram o direito à dignidade, à vida, ao lazer e, acima de tudo, ao respeito. Mas que se mostram ineficientes em uma sociedade que preconiza a beleza, o consumo e as facilidades em detrimento da sabedoria, da educação, dos valores morais, enfim, do respeito às diferenças.




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