Redescobrindo o Brasil

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Raquel de Medeiros

Foto: Marcos Pinto
Apaixonado, o ator português Ricardo Pereira, que vem ganhando destaque nas novelas globais, não hesitou em deixar o país de origem para morar onde o coração escolheu; trouxe a mulher, fixou raízes e diz que quer filhos com sangue verde-amarelo. Foto: Marcos Pinto

Em abril de 1500, os portugueses se deslumbraram com terras intocadas e, até então, desconhecidas dos olhares europeus. Era um solo de fartura, de tempo bom. Promessa de felicidade. Sem pensar duas vezes, botaram os pés e fincaram a bandeira. Encantaram-se com cores, cheiros e sabores tão atraentes, tão inéditos. Mais de 500 anos depois, a história se repete. O ator português Ricardo Pereira chega ao Brasil. A primeira experiência, em 2003, o deixou extasiado e – por que não dizer? – apaixonado.

Surpreendeu-se  com a beleza das praias, o clima agradável e o gosto das frutas. Porém, o  Brasil não mais se limitava a isso, estava diferente. Em meio à natureza cresceu a selva de pedra, com suas vantagens e desabonos. O povo, que desconhecia a própria identidade, começou a se reconhecer entre a brasileira mistura. E o País que antes se escondia por entre as frestas do desenvolvimento, agora puxava o cordão de uma economia mais estável, chamava atenção pela sobrevivência à crise, atraía os holofotes mundiais para a política, o biodiesel, a descoberta de petróleo, a evolução científica, a produção têxtil, a moda.

Os olhos estrangeiros de Ricardo continuaram a se perder entre as belezas naturais. Inevitável. E ele encontrou aqui a terra prometida, onde poderia realizar seus sonhos. Encantado, não hesitou em aprender a compreender essa menina difícil chamada Brasil. Pouco tempo depois, em 2004, sem poder resistir, decidiu ficar. “Me apaixonei quando vim fazer a primeira novela (Como Uma Onda, da Rede Globo).”

Só que, ao contrário do que fizeram os portugueses na época do descobrimento, querendo passar as  experiências ao povo colonizado, o ator virou o espelho para a própria face e se viu misturado a toda essa gente que tem coração mole mas braços fortes, que não perde a ginga mesmo em caminhos  tortuosos e tem a incrível manha de lutar sorrindo.

 
Descobertas

Ricardo não apenas se preocupou em colocar os pés no Brasil, mas também em compreender o lugar onde estava pisando. Experimentou da culinária tupiniquim: “Gosto de comida mineira, comida de boteco, petisco é maravilhoso.” Descobriu as frutas: “Comi algumas que eu nunca tinha escutado falar. Você descobre as coisas quase que como um bebê”.

 
Mulheres

O ator também observou as mulheres. Femininas, curvilíneas, de beleza única, exóticas. “O Brasil tem mulheres lindas. Portugal e Angola sofrem mistura, mas o Brasil leva ao máximo: tem índio, negro, branco, holandeses, alemães. Eu gosto.”
E percebeu que elas não são só isso. As pernas torneadas contrastam com o colo largo, acolhedor. Mães dedicadas. Que acordam às 6h para cuidar da família, passam o café, chamam os filhos para ir à escola. Todo dia sempre igual, como diz a música de Chico Buarque. As mãos delicadas e benfeitas, afinal, também são mãos de luta e trabalho. Ricardo ficou admirado pela beleza e pela coragem. A força brasileira de persistir mesmo quando a maré vai totalmente contra. “Gosto dessa raça das pessoas de, às vezes, enfrentarem situações piores e não tão vantajosas para elas e continuarem com esse ânimo, essa garra, essa vontade de vencer. Isso me deixa inspirado.”
 

Coração lusitano

A graça e a ginga da mulher brasileira, no entanto, não foram suficientes para conquistar o coração do ator português, que foi fisgado por uma conterrânea, Francisca Pinto Ribeiro, 27 anos. “Já tive meus romances, minhas histórias de amor em Portugal, no Brasil, em outros lugares, mas no momento de eu me entregar e me apaixonar de verdade  foi com ela. A gente não escolhe por quem se apaixona, e ela me fez despertar esse sentimento, é a minha mulher, para sempre.”
E agora o sangue lusitano da família Pereira vai ficar ainda mais verde-amarelo. Francisca está grávida de três meses.  “Estava na mão do destino... Fiquei muito feliz! Já me sinto diferente, mas não sei ainda explicar a sensação. É tudo muito novo, mas estou adorando e curtindo demais. Provavelmente criarei meus filhos aqui. Não tenho hora de ir embora.”
 

Desenvolvimento

Como a Garota de Ipanema que passa olhando para frente, concentrada nos passos, mas que joga charme delicado para quem a observa à espreita, o  País que estava à margem, a “grande Pátria desimportante”, como rotulou Cazuza, assim como quem não quer nada, elevou a autoestima, aprendeu com os erros, subiu degraus e atraiu a atenção além dos próprios muros. “O Brasil está no centro, todo mundo está olhando para o País de forma muito atenta. Tenho visto que está mudando muito. Toda gente ama o Brasil.”

 
Violência

A beleza do País ainda é a primeira coisa que chama a atenção do  mundo. O turismo cresce a cada dia. E além das expectativas. Segundo dados do último levantamento do IBGE, o setor teve crescimento de 22% entre 2003 e 2007, superando o avanço da economia no período.

Porém, a terra de sol, mar, Carnaval e povo sorridente esconde também uma dureza difícil, enraizada pela antiga diferença social. Infelizmente, quem põe os olhos a fundo neste lugar ainda não tem como deixar de observar um ‘quê’ de ‘gênio difícil’, que repele e incomoda. Mas não a Ricardo. “Essa violência que passa na comunicação internacional é um exagero. Eu vivo aqui há sete anos e nunca tive problema. Claro que acontece, mas é um País com 200 milhões de pessoas. Óbvio que a proporção das coisas aqui seria muito maior.”

A facilidade de compreender talvez venha da formação do ator. Psicólogo, acredita que o curso foi fundamental para que entendesse melhor as pessoas, a vida e a profissão. “Não há dúvidas de que me ajuda na criação de personagens e no dia a dia, na minha vida, porque a Psicologia estuda o ser



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