O mundo é pouco para ela

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Andréia Meneguete

Foto: Gustavo Scatena
Ana Paula Padrão é incansável na busca pela melhor notícia, nem que para isso ela precise atravessar fronteiras. Foto: Gustavo Scatena

Pequena, mas notável. Ela é tão destemida que chega a ser abusada ao achar que o outro lado do mundo é logo ali, que não existem fronteiras capazes de deter as suas intenções. E que fazer reportagens especiais em lugares com culturas diferentes da ocidental é um risco que vale pagar nem que seja com a própria vida. Entender como aquela mulher aparentemente frágil, de 1,62 m, consegue ser forte e exemplar em todas as funções que se propõe a fazer é algo estranho no primeiro momento. Com sede por notícia, ela, em seus 45 anos de idade e 25 de carreira, viajou pelos cincos continentes, somando mais de 30 países visitados. E tudo a trabalho, nada de passeio turístico, com cliques dignos de porta-retratos ou apelos gastronômicos.  Por essas andanças, o que prevaleceu mesmo foram as noites não dormidas e estômago vazio, assim como a última viagem ao Afeganistão após a morte de Bin Laden. O medo está sempre ao seu lado, a preocupação do marido, o economista Walter Mundell, é constante, mas ela não olha para trás. “É o medo que faz você avançar com prudência”, sinaliza. Mas, daí, também vem o resultado: audiência e respeito. 

Em tempos de era digital em que a condição de espaço e localidade já não é mais primordial para se fazer notícia e o tempo é um inimigo da qualidade, Ana Paula Padrão mostra que não se rende às características típicas da sociedade contemporânea. Ela faz questão de estar onde a informação acontece e dribla a falta de espaços na agenda com muita maestria. Para ela, nada é impossível. Pelo contrário, faz acontecer. “Só quero contar uma boa história. Desejo estar perto das pessoas reais, saber o que as fazem rir e sonhar. Gosto muito de ver gente. De sentir gente. É por isso que estou no jornalismo”, explica.

E quem a conhece, sabe: se houvesse uma guerra na Lua ou um novo formato de política socioeconômica em Marte, não tenha dúvidas de que a jornalista pegaria a primeira espaçonave e voaria, literalmente, direto para lá. Nem que para isso precisasse convencer em pouco tempo a direção do jornal em que trabalha.

Diante do que quer, a jornalista sabe persuadir e mostrar que estar perto dos fatos é essencial para se fazer um bom jornalismo. “A ‘baixinha’ se torna uma gigante na frente das câmeras. Comparando com o futebol, ela é o meio-campista que faz lançamentos de longa distância e precisos. Só que vez por outra ela fica no banco, ou melhor, fora da bancada do jornal”, testemunha o jornalista e companheiro de trabalho Celso Freitas.

Poucas são as pessoas que detêm de perspicácia e sabedoria para enxergar o que se passa nas entrelinhas de uma história. O ponto de vista diferenciado, a percepção diante de um fato pode ser determinante na hora de contar uma simples notícia, um romance ou até uma tragédia. São nos detalhes e na busca pela qualidade que Ana Paula se diferencia e conseguiu chegar ao topo.  “Sou menos cricri do que a minha fama. Acho que tenho que perseguir a qualidade, por mais que me dê trabalho. Não vou fazer as minhas sete horinhas e ir embora. É ruim trabalhar só por trabalhar. Adoro o que eu faço”, sentencia.

A menina da Brasília de Oscar Niemayer vivenciou uma solidão na infância quase que igual à da cidade. Viu a capital crescer e evoluir pensando como seria o mundo fora dali, onde  a terra era vermelha e o céu anil. Com os poucos amigos que moravam próximos a sua residência e os dois irmãos que demoraram a chegar, a filha mais velha da família de mineiros aprendeu que com os livros e o olhar atento ao próximo, a imaginação voava e a levava para mundos distantes, o do imaginário. Sair do óbvio fez com que a criatividade fluísse e as ideias sobressaíssem.  Distante das brincadeiras de menina, sua diversão quando pequena, no entanto, era caçar cigarras e observá-las em garrafas de vidro.

Com sessões de análise, descobriu a fundo o seu eu. Mexeu nas gavetas que estavam emperradas e foi atrás do amadurecimento, da evolução. Perdoa-se muito mais do que há dez anos e aprendeu a se amar com tantos defeitos, mas percebeu que o que vale a pena é valorizar as qualidades, que não são poucas. Ana Paula fez das desavenças da vida motivação para guinar o cotidiano. Foi atrás dos sonhos, foi realizar planos.

Após 18 anos de TV Globo, sendo que cinco deles à frente da bancada do Jornal da Globo, além dos outros que atuou como correspondente internacional e parte das equipes do Bom Dia Brasil e Jornal Nacional, topou o desafio de reestruturar o departamento de jornalismo do SBT. Após quatro anos na emissora de Silvio Santos, foi convidada a alavancar a audiência do Jornal da Record, onde está há dois anos.

Ana Paula é mesmo incansável, não para um minuto, tem sempre um projeto para ser realizado. O próximo passo fica por conta de um trabalho inédito com foco no público feminino. “Esse projeto que acalento é conversar com um segmento da sociedade que são as mulheres. Elas precisam se ver representadas, talvez possa ajudar. Estudo tanto isso que eu penso num livro e numa plataforma de comunicação na internet”, revela. Isso sem contar que todas as manhãs Ana Paula marca ponto na Touareg Conteúdo, empresa que abriu na área de comunicação corporativa, para atender os diversos clientes.

Tamanhas são as conquistas que até parece ser fácil viver na pele de uma personalidade que obteve o reconhecimento do público e o sucesso naquilo que se propôs a fazer. Mas, não o é. Sair da zona de conforto, vivendo um mundo entre mundos. Perceber a alma humana. Buscar o equilíbrio e a serenidade. Desafiar o medo. Conquistar o sucesso. E depois do expediente ainda, sim, cuidar dos sonhos e da vida a dois. Manter-se no topo exige dedicação e doação na sua totalidade, assim como foi na maior parte da carreira, quando abdicou de fins de semana e passou longos períodos trabalhando. Ela não desacelerou, mas hoje não abre mão de jantar todos os dias com o marido e ter religiosamente duas férias por ano.
 



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