Fome de bola

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Miriam Gimenes

Foto: Thiago Justo
Bruno César diz que 2011 é o ano de sua afirmação, mas precisa superar a má fase. Foto: Thiago Justo

Rápido, inteligente, exímio armador de jogadas, puxa muito bem o contra-ataque, tabelas ágeis, jovem, promissor, disciplinado, excelente caráter e profissionalismo. Mesmo com todas essas características descritas no seu currículo profissional on-line, o meia-esquerda do Corinthians Bruno César, 22 anos, demorou para conquistar espaço no mundo do futebol. Aos que pensam que a sorte foi o que o levou a ganhar o troféu de revelação do Campeonato Brasileiro de 2010, o jogador dá o recado: “Batalhei muito para estar aqui.”
Isso porque a vida do hoje camisa 10 pode ser dividida em duas partes: antes e depois de 2010. Para quem não acompanha o noticiário de futebol e tampouco é corintiano, explica-se: ao contrário da maioria dos garotos, que brilham antes de completar duas décadas de idade, Bruno destacou-se apenas aos 21 anos, quando disputou o Campeonato Paulista pelo Santo André. A atuação foi tão boa que, assim que acabou o torneio, realizou seu grande sonho: jogar pelo time do coração, o Corinthians.

Foi no Alvinegro que ganhou notoriedade e fez valer a decisão tomada aos 5 anos de idade, logo comunicada aos pais que queria ser jogador de futebol profissional. Honrou todas as bolas de capotão que pedia de presente – em qualquer que fosse a data especial –, conforme revela sua mãe, Tereza Vicentin, 45 anos. E é a ela, cujo nome tem tatuado no seu pulso direito, que Bruno dedica suas conquistas que, embora tenham demorado a acontecer, têm sabor de vitória. O jogador não para por aí. “Esse é o meu ano da afirmação. Não quero ser como aqueles jogadores que jogam só um ano.” Não é difícil perceber que ele tem fome de bola, apesar da má fase neste início de temporada, que o levou a ser substituído em algumas partidas do Timão.


GAROTO DECIDIDO

É fácil entender porque os louros demoraram a acontecer na vida de Bruno César. Tereza recorda que o filho passou do tempo para nascer e quase morreu. “Deu um trabalho danado. Nasceu pretinho, acho que por asfixia. Não sei como sobreviveu. Creio que é porque tinha a missão de ser jogador”, lembra a mãe, que mora em Americana, interior de São Paulo. “Fiz um juramento (na época): dessa dor (de parto) eu não morro.” Em virtude do episódio traumático Bruno é filho único.

Ainda aos 5 anos, pediu à mãe que o matriculasse em uma escolinha de futebol. O pequeno gravou o telefone na memória, pedindo para que ela ligasse. Dias depois dava o pontapé à carreira, que teve início de trajetória atribulada.

O momento mais preocupante, conta Tereza, foi aos 14 anos, quando  o filho jogou pelo Bahia – antes teve passagem no União Barbarense, time da cidade onde nasceu, Santa Bárbara d´Oeste. “Não gostaria que ele fosse jogador de futebol para que não precisasse ficar fora”, admite a mãe. O pior é que, na mesma época, ela separou-se do marido.

Com a decisão do filho, Tereza diz que fez muita oração para que as portas se abrissem.  “Acho que Deus ouviu minhas preces e deu a oportunidade (de jogar no Corinthians).”

Mas antes de chegar ao Timão, o jogador ralou muito. Passou pelo amador do São Paulo e do Palmeiras e seguiu para o Grêmio, onde não se firmou. Foi contratado pelo Ulbra, do Rio Grande do Sul, onde começou a se destacar, indo para o Noroeste. Por fim, jogou no Santo André, onde teve a chance de ser visto pelos grandes times. “Serei sempre grato ao Santo André por ter me dado a oportunidade de ter feito aquele Paulista (do ano passado, em que a equipe foi vice-campeã).” Foi aí que os times maiores conseguiram ver as características descritas no currículo on-line do rapaz.


DE FIGURANTE A PROTAGONISTA

Bruno lembra que quando jogava no Santo André teve de lutar para conseguir essa chance, pois o time era  repleto de estrelas (dentre as quais Marcelinho Carioca e Gustavo Nery). O jogador teve de amargar um tempo na reserva. “Soube esperar”, acrescenta. A versão é confirmada por Rodrigo Quito, preparador físico do Ramalhão, que acompanhou a trajetória de Bruno. “Sempre disse a ele que a sua hora ia chegar, tinha diferencial. Ele nunca reclamou de esperar.”

Para Quito, que está há cinco anos no time, a determinação de Bruno o ajudou a se destacar. “Ele sempre foi comprometido em cumprir essa meta e se esforçou para isso. Dedicou-se tanto que conseguiu.” O preparador lembra que, desde sua chegada ao Grande ABC, Bruno sempre foi brincalhão, interagia com o grupo, ainda que tímido e de poucas palavras. 

Ao presenciar o treino do Alvinegro, o jeito brincalhão pôde ser constatado. Ficou tímido com as fotos, mas logo esqueceu os cliques e pôs-se a sorrir em conversa com a dupla Ro-Ro (Ronaldo e Roberto Carlos). Foram eles que o receberam quando chegou ao Corinthians.
Bruno revela que sentiu a pressão de jogar em time grande, mas que agora está acostumado com a rotina. Acredita que o sucesso tardio o ajudou, porque conquistou o sonho mais amadurecido. “Para mim é muito importante o status que tenho hoje. Passei por várias coisas, isso fez a diferença em um clube grande: saber o que fazer na hora certa e o que não fazer na hora errada.”


GOL DE PLACA

Já no primeiro jogo com a camisa do Timão, mostrou a que veio. Foi o autor do 100° gol no ano do centenário do clube, em um jogo contra o Botafogo, em setembro. Ao tornar-se conhecido e querido por uma das maiores torcidas brasileiras, mudou sua rotina.

Não é mais tão acessível como quando jogava no Ramalhão, assessores o blindam de todas as formas. Ainda assim tenta ter uma vida normal. Ele mesmo reconhece. “Aqui no Corinthians é completamente diferente do que eu fazia no Santo André, que ia para onde queria. Preciso pensar na minha imagem”, revela. Com jogo de cintura que o faz autor de dribles incríveis no campo, aprendeu a lidar com essas mudanças e hoje diz estar tranquilo em relação à fama.

Muita dessa consciência também é resultado das conversas com a mãe, de origem simples, que faz questão de ressaltar que não é porque está no topo e é a grande promessa do Corinthians que tem de esquecer de preceitos importantes. “Tem de tomar cuidado para



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