O legado de Bowie

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Vinícius Castelli

Camaleão, starman, ousado, provocador ou apenas Bowie. Não importa como o chamem. Artista que nunca teve medo de se reinventar, ainda que não fosse preciso, David Bowie partiu. O incansável cantor, que disse uma vez que podemos ser todos heróis, ainda que por um dia, morreu no domingo, aos 69 anos, após lutar 18 meses contra um câncer. O comunicado oficial foi feito em sua página no Facebook.

Incansável, experimentalista de mão cheia e com um olho de cada cor, o britânico, que dedicou sua vida à arte, estava há tempos distante dos holofotes. Sua última turnê foi em 2004, batizada A Reality Tour, ano em que teve de fazer angioplastia. Sentiu dores no peito em show na Alemanha e foi direto ao hospital. Fez uma apresentação ainda em 2006, em Nova York. Mas, assim como a arte nunca o deixou, Bowie nunca deixou a arte. Seguiu trabalhando, se conhecendo, quebrando preconceitos e andando por onde bem entendia, ainda mais se fosse fora dos padrões ditados por outros.

Nascido David Robert Jones, Bowie completou 69 anos na sexta-feira, 8, mesma data em que deixou um grande presente aos fãs, seu novo disco de estúdio, Blackstar, primeiro após três anos sem álbum de inéditas. Sempre com veia teatral em seu trabalho musical, o cantor e compositor nunca teve medo de ousar.

Nos anos 1970, enquanto alguns ainda cantavam sobre amor e outros falavam das desgraças do mundo, Bowie desconstruía o que fosse. Pintou e cortou os cabelos enquanto todos usavam longas madeixas. Usou botas, roupas coloridas e quebrou as paredes do rock com o disco The Rise and Fall of Ziggy Stardust And The Spiders of Mars (1972), talvez seu trabalho mais icônico, em que Ziggy – seu personagem de sexualidade ambígua – vem à Terra e se apaixona pela música.

Criador de figuras como Major Tom e White Thin Duke, lançou ao longo de mais de quatro décadas de carreira álbuns que se tornaram marcos não só para o rock, mas para a música mundial, como Space Oddity, Hunky Dory e “Heroes”. Teve a proeza de nunca fazer nada parecido. E não fez música boa só nos anos 1970 ou 1980. Fez isso a vida toda. Basta escutar Reality (2003) e The Next Day (2013). Como sempre, gratas surpresas.

COMOÇÃO
Bowie foi lembrado por vários nomes nas redes sociais após o anúncio de sua morte. Grande amigo, Iggy Pop disse que “a amizade de David foi a luz da minha vida. Nunca conheci uma pessoa brilhante assim. Ele foi o melhor que existiu”. Madonna foi outra que se expressou. “Estou devastada. Este grande artista mudou a minha vida. Primeiro show que assisti foi em Detroit. Descanse em paz. Talentoso. Único. Gênio. Jogador desafiante. O homem que caiu na Terra. Seu espírito vive para sempre! Tive sorte de conhecê-lo! Eu te amo muito!”, disse.

NOVO DISCO
Na sexta-feira, 8, dois dias antes de sua morte, David Bowie pôs fim ao hiato de três anos sem trabalho de inéditas com Blackstar. Bowie quase não promoveu o disco, lançou no dia 7 o vídeoclipe de Lazarus, em que aparece deitado em cama e canta: ‘Olhe aqui, estou no céu. Tenho cicatrizes que ninguém pode ver’. Em novembro lançou vídeo da faixa título. No álbum, o camaleão quebrou barreiras de novo, nem pensou em passar perto do convencional e se reinventou, outra vez. Arranjos de jazz se misturam a climas densos e soturnos como em composições do calibre de Sue (Or In a Season Of Crime). Outro trabalho imperdível, como se pudesse ser diferente.

NO CINEMA
Artista completo, David Bowie ultrapassou a barreira da música e mergulhou na sétima arte. Suas atuações para o cinema (foram mais de dez) renderam obras como Labirinto – A Magia do Tempo (foto), de 1986, em que viveu Jareth, o Rei dos Duendes. Fez também O Homem Que Caiu na Terra, em que encarnou Thomas Jerome Newton, alienígena que busca salvação para seu planeta. Participou também de Zoolander, com Ben Stiller, e emprestou sua voz para a animação Arthur e os Minimoys.

Cantor veio ao Brasil duas vezes
O Brasil não escapou do espetáculo de David Bowie. O artista desembarcou por aqui pela primeira vez em setembro de 1990, com a turnê Sound And Vision. Fez a estreia no Rio de Janeiro, na Praça da Apoteose, para 12 mil pessoas, e viajou para São Paulo de ônibus (tinha medo de avião).

Realizou três apresentações na Capital paulista, duas delas nos dias 22 e 23, no Parque Antártica (hoje Allianz Parque), para cerca de 40 mil pessoas em cada. No palco, Bowie entoou temas como Space Oddity. Aproveitou a viagem para caminhar pelo centro da cidade e assistiu a show de lambada. A despedida foi em local menor, no palco do hoje extinto Olympia, no dia 25.

Em 1997, retornou a São Paulo para o festival Close-Up Planet, realizado no dia 1º de novembro na pista de atletismo do Ibirapuera, ao lado de nomes como No Doubt e Erasure. Em 2014, o Museu da Imagem e do Som (MIS), em São Paulo, brindou os fãs com a mostra David Bowie, com figurinos usados pelo artista e diversos outros objetos. Em 71 dias de exposição, mais de 80 mil pessoas passaram pelo espaço.

OUÇA
Segunda obra lançada pelo artista, Space Oddity (1969) contém temperos folk e muita psicodelia. Destaca-se a canção que dá nome ao álbum.

The Rise And Fall of Ziggy Stardust (1972) é marco na carreira de Bowie. Com visual andrógino fez nascer temas como Starman e Ziggy Stardust.

De visual colorido e som nada convencional, ele seguiu quebrando preconceitos artísticos em Aladdin Sane (1973). The Jean Genie é um dos destaques.

Com instrumentos de sopro e coro, o compositor brindou seu público com Young Americans (1975). As faixas Win e Right são imperdíveis.

Em 1983, Bowie lançou o álbum Let’s Dance. Com ‘pegada’ dançante, se reinventa outra vez em faixas como Modern Love e China Girl.

“Heroes”(1977) é o segundo disco de trilogia que começou com Low. Saiu após o artista, renovado, passar tempo com Iggy Pop na Alemanha.




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