Luta por liberdade

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Vinícius Castelli, Rodrigo Mozelli e Oscar Brandtneris

Texto: Vinícius Castelli, Rodrigo Mozelli e Oscar Brandtneris

Você pode até achar que as coisas são como são e ponto final. Só que não. Diversas vezes vemos situações por aí em que a falta de respeito reina absoluta. Pelas ruas mesmo, quando alguém se acha no direito de chamar alguma mulher de gostosa ou de outra coisa que lhe venha à cabeça. Coisa típica de quem acredita que pode sair por aí dizendo o que bem entende. E pior, há vezes em que, se ela não olha de volta, ainda toma xingamento. Não adianta torcer o nariz e dizer que isso é besteira. Na verdade, essa é a unha de um problema que mergulha numa vasta imensidão. É preconceito contra as pessoas homossexuais, negras e, é claro, com mulher sim. Situações de dominação física e psicológica. Violência. Isso sem falar em trabalho quase escravo mundo afora, desigualdade de salários, falta de oportunidades, assédio em ambiente de trabalho. E por aí vai.

Transformação exige esforço. E essa discussão vem de longe, seja pela inclusão, respeito e tudo que envolve os direitos das mulheres. Na França, no fim dos anos 1700, a dramaturga e ativista política Olympe de Gouges (1748-1793) usou sua voz para pedir voz para todas as mulheres. Queria que elas tivessem os mesmos direitos que os homens. Corajosa, redigiu a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã. E a luta seguiu, segue, inclusive no Brasil, e com força.
 
As mulheres brigaram para poder votar, para trabalhar. Para parar de apanhar. Sim, tem homem por aí que se acha dono da mulher e, alguns deles, no topo de suas brilhantes e enormes ignorâncias, acham que têm direito de decidir algo, quando não tudo, por elas. E é por essas e por muitas mais que as mulheres têm saído às ruas – mais uma vez ao longo de tantas na história –, se manifestado, se enchido de coragem quando muitas vezes não se sabe nem de onde tirá-la e lutado por vida justa.
 
Feminismo não é o oposto de machismo. A primeira palavra que vem à cabeça para muitas delas quando o assunto é esse é a equidade, que quer dizer respeito, justiça, empatia. Direitos! Feminismo pode ser também o fim da dominação de um gênero por outro. O fim da relação abusiva. Mas se a mulher está em relacionamento abusivo, seja no emprego ou dentro de casa, por que ela não sai? E você, quantas vezes conseguiu se livrar de alguma situação extrema, difícil, assim, de bate-pronto? E ainda tem de levar em conta o histórico do psicológico estuprado que a pessoa carrega após tempos de abusos na vida. Afinal, para muitos, a mulher foi feita a partir da costela de Adão, não é? E mesmo que tenha, deve ser respeitada. E nesse guarda-chuva de quem grita por direitos pode-se colocar também as pessoas trans*, que incluem transgêneras e transexuais.
 
 
 
Tuanny Souza Lanza, 24, é uma das que estão na luta para que as mulheres possam usufruir de direitos básicos “o que é muito atrasado por parte da sociedade em que vivemos. Ao contrário do que muitos pensam, nós não lutamos para sermos iguais, ou termos os mesmos direitos do que os homens. Lutamos para termos os nossos, que não são necessariamente os mesmos que os deles. A questão da descriminalização do aborto, por exemplo, não diz respeito a nada relacionado aos direitos dos homens. É uma questão de Saúde pública e de autonomia do corpo da mulher. O objetivo todo dessa luta é o empoderamento feminino, a independência, a autonomia e o direito de sermos livres, acima de tudo. Por isso que eu acredito que o feminismo deva lutar por todas as mulheres, até por aquelas que não entendem a causa e se dizem contra. O feminismo é uma luta de mulheres pelas mulheres, sejam elas cisgeneras, transexuais, lésbicas, assexuadas ou qualquer outra forma com a qual se identifiquem”, explica a estudante.
 
Tuanny é mais uma, entre tantas, que já mudou a roupa que queria usar antes de sair de casa pois sabia que os homens ‘mexeriam’ com ela. Hoje não mais. “Saio como bem entender, porque o que tem que mudar é o respeito deles e não minha roupa. Todas as vezes em que somos assediadas na rua nos sentimos humilhadas. Todas as vezes em que escutamos 'mas você é mulher, não deveria fazer isso', somos humilhadas. Todas as vezes em que ouvimos que ‘algo é de mulherzinha’, ou que ‘isso não é coisa de menina’, somos humilhadas”, completa.
 
Ela remete sua atenção para outro fator ainda, de que existe a questão dos relacionamentos. “Sempre que um homem nos diz o que podemos ou não fazer, ele nos diminui, por exemplo. Sem a desconstrução, tudo isso é romantizado, é colocado como cuidado, carinho, proteção. O que mais vemos hoje em dia é humilhação disfarçada de cuidado; assédio disfarçado de elogio; objetificação disfarçada de brincadeira.”
 
Pesquisadora na Universidade Estadual da Pensilvânia, nos Estados Unidos, Katiuscia Moreno Galhera, 30, acredita que toda mulher, de alguma forma, milita contra as injustiças ou desigualdades de gênero que viram opressão no seu cotidiano. “Mesmo que não diretamente, conscientemente, elas apresentam alguma resistência à repressão. O Foucault (filósofo e historiador francês – 1926-1984) tem uma teoria interessante que diz que toda repressão apresenta algum tipo de resistência, porque resistência não se limita somente a fazer parte de um coletivo, entrar em greve, ir para as ruas.Não se restringe a questões materiais de contra-hegemonia ou de contraprodução de valores, práticas materiais. Ele diz que só o fato de achar que aquilo é injusto já é um tipo de resistência”, explica ela.
 
E se você, homem, acha que esse movimento todo é algo só para mulheres, que só elas devem lutar por tudo isso e mais, que tal refletir a respeito, conversar com algumas delas e ter essa causa como sua também? Rafael Roberti, guitarrista e compositor da banda punk Subviventes, acredita que o feminismo não é apenas movimento para mulheres, mas para homens que compartilham dos mesmos ideais propostos, que também acreditam que não deve haver essa distinção, ignorando o comportamento machista existente ainda na sociedade.
 
Tudo bem, mas o que um homem já consciente pode fazer? No caso de Roberti, ele ajuda com mudanças em seu comportamento, “observância do que acontece ao redor e a divulgação desses direitos, o que acho importantíssimo, pois caso contrário, de nada vale o empenho de mudar uma situação


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