O dono da coroa

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Miriam Gimenes

 Insígnia de soberania e nobreza, a coroa é a marca registrada de todo monarca. Desenhada em formato circular – o que representa a perfeição –, uma vez colocada na cabeça ela une o que está abaixo dela, o humano, ao que está acima: Deus. Representa também a promessa de imortalidade, ainda que seja na memória, como recompensa do legado deixado em vida. Tarcísio Meira, 80 anos, não desfila com o adorno. O utiliza apenas todas as sextas-feiras, sábados e domingos quando sobe ao palco do Teatro Porto Seguro, em São Paulo, para participar da peça O Camareiro, na pele de Sir, ator veterano que pela enésima vez interpretará o Rei Lear, de Shakespeare. Mas se na história da dramaturgia houvesse semelhante condecoração, ele despontaria como favorito sem concorrentes.

Para comprovar esta afirmação basta vê-lo no palco. Prestes a comemorar seu aniversário – em 5 de outubro – o vigor e a presença são de um jovem de, pelo menos, metade da sua idade. Domina, magistralmente, a cena. Embora tenha demorado 20 anos para encarar um teatro novamente, foi certeiro na decisão. O responsável pelo seu retorno é o seu companheiro de trabalho e produtor da peça, o ator Kiko Mascarenhas, que faz o papel de Norman, fiel escudeiro de Sir. “O Tarcísio é um lorde. Um cara muito educado, tranquilo, disciplinado. Quando começamos a fazer leituras, ele rapidamente foi decorando, tive de correr muito atrás na questão da decoreba. Sempre antes da peça dou um pulo em seu camarim e Tarcísio sempre está com o texto, revendo, observando. Não para de estudar. É um exemplo. Olho para ele e falo: ‘Cara, quero chegar aos 80 como ele, com fôlego, vontade de fazer e com essa memória.' 

 

Na história, que estará em cartaz até dia 13 de dezembro, Sir é um dono de uma companhia de teatro inglesa, à época da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), e está à beira de um colapso. Após crise nervosa, reluta em levar adiante o espetáculo que tem de fazer no mesmo dia, mas é encorajado pelo camareiro. “O seu personagem tem muito texto, uma carga dramática que oscila e ele dá conta muito bem. É um exemplo de um cara que dedicou a vida inteira ao ofício. A história de Tarcísio se confunde com a da TV, da interpretação, do atuar. É um homem que passou a vida inteira trabalhando e depois, lá pelas tantas, foi enveredar pela questão da terra, virou fazendeiro. É uma pessoa muito simples”, completa Mascarenhas, que trabalha pela primeira vez com seu o ídolo.

 

 

Tarcísio estreou no teatro em 1957 na peça A Hora Marcada. Na televisão, apareceu pela primeira vez em Noites Brancas, teleteatro da TV Tupi, de 1959. Foi o primeiro galã das telenovelas brasileiras, em 2-5499 Ocupado, da Excelsior, ao lado da mulher, Glória Menezes, com quem está casado há 54 anos. De lá para cá, foram mais de 40 folhetins ­­­– seria protagonista da próxima das 21h, A Sagrada Família, de Maria Adelaide Amaral, que foi adiada –, 20 filmes e alguns seriados. “Era difícil fazer televisão, as pessoas não têm ideia dos problemas pelos quais nós passamos. Mas valeu a pena. Somos amplamente recompensados pelo carinho do público, pela atenção, audiência e pela sensibilidade das pessoas”, comemora Tarcísio, que conversou com a Dia-a-Dia atenciosamente poucos minutos antes de entrar em cena. Confira, a seguir, um pouco do que pensa sobre a televisão, o envelhecimento, a terra e o amor. Porque se tem alguém que entende deste último item, este alguém é Tarcísio Meira.

 

 

‘SIR’ O SEDUZIU

“(Sir) É um personagem muito próximo de nós, atores. Fala muito perto dos nossos problemas, do nosso cotidiano. Ele está passando um momento de crise e está à beira de um colapso por exaustão. A ação da peça se passa durante a Segunda Guerra Mundial. Imagine o que era fazer teatro sendo bombardeado o tempo todo. Estão todos os personagens em um momento difícil. A peça, embora seja grande, também é uma comédia muito gostosa. As pessoas riem muito. Eu gosto de fazê-la, me sinto envolvido.”

 

 

PREPARAÇÃO

“Quando fazia teatro, era terça, quarta, quinta, todo dia tinha sessão. Nos fins de semana eram duas apresentações. Hoje em dia as coisas são diferentes, existe a televisão, os atores têm outros compromissos. As coisas eram mais difíceis. S



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