Pequena notável

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Miriam Gimenes

 É uma pena que não tenha dado tempo de o radialista César Ladeira conhecer Adriana Esteves. Criador de nomes para os artistas de sucesso, fez ‘a passagem’ três meses antes de ela nascer. Foi dele a brilhante ideia de chamar Carmen Miranda de A Pequena Notável, nos idos da década de 1930. Se tivesse presenciado a ascensão da atriz carioca, facilmente diria que ela é a herdeira da alcunha. No ‘alto’ do seu 1,60 m não canta e dança como a artista ícone, mas a seu exemplo atua e torna-se grande nos mais variados sentidos da palavra. E não é só isso: embora tenha acabado de se despedir de Inês, em Babilônia, foi com a sua personagem xará da portuguesa, a Carmem Lúcia, de Avenida Brasil (2012), que rompeu as fronteiras brasileiras para conquistar a América Latina – onde chegou a virar capa de revista ­– e tatuou, com tintas permanentes, seu nome na história da teledramaturgia.“

 
Carminha virou meme, viralizou na internet. Só no Facebook, pelo menos quatro páginas ainda levam a foto dela no perfil. À época da novela, suas frases pipocavam diariamente na rede social e ela chegou a ser eleita pela revista Época como uma das 100 personalidades mais influentes daquele ano. Não à toa, o folhetim foi licenciado para 130 países – entre eles Estados Unidos, Armênia, Suécia e Guatemala – e ganhou o horário nobre das emissoras locais. Por conta da personagem, Adriana disse já ter sido reconhecida no Chile e na Costa Rica. “Quando aconteceu, imaginei que fossem brasileiros ou portugueses, mas eram pessoas da Costa Rica mesmo”, diz a atriz. Embora tenha rendido notoriedade, assim como ela disse, falar que sua carreira se restringe a este papel é uma heresia.
 
 
Adriana nasceu no Rio de Janeiro e, quando criança, dividiu sua arte entre pliés, pirouettes e pas de deux. Depois de dedicar-se ao balé clássico, desistiu de ser bailarina e iniciou a carreira de modelo. Em 1988, estreou como atriz na novela Vale Tudo. No ano seguinte, participou do quadro Estrela Por Um Dia, do Domingão do Faustão, e ganhou notoriedade. Tanto que surgiu o convite para ser a Tininha, de Top Model (1989). “Desde a Tininha até o presente trabalho – a Inês de Babilônia – fica evidente o cuidado de Adriana Esteves na composição de suas personagens. Detalhes que, aos poucos, a atriz vai esmiuçando para apresentar-nos a complexidade de cada uma de suas criaturas, a exemplo da romântica e determinada Marina (Pedra Sobre Pedra); da sedutora Sandrinha (Torre de Babel) e da feminista Catarina, da clássica O Cravo e A Rosa”, diz Mauro Alencar, doutor em teledramaturgia brasileira e latino-americana pela USP.
 
Quando a atriz fez Mariana, de Renascer (1993), no entanto, sofreu série de críticas pela atuação. Já confessou em algumas entrevistas que elas a fizeram entrar em um quadro depressivo. Tanto que, tempos depois, interpretaria a Babalu, de Quatro por Quatro (1994), mas deixou as gravações antes de a novela estrear. Embora a novela atual também tenha sido bastante alvejada, tanto pelo público quanto pela crítica, Adriana diz que este tipo de avaliação não a atinge mais. “Nunca fui uma pessoa que se preocupou muito com a opinião dos outros. Procurei sempre seguir minhas opiniões dentro de minha base ética e moral. E, sem dúvida, a maturidade só vai nos permitindo mais pensar desta forma”, afirma. Carminha, para Mauro, não foi sua redenção. “Muito antes de Carminha a atriz já voltava à TV completamente renovada na arte dramática televisiva, com as personagens Sandrinha, Catarina e até mesmo com a jovem Nazaré Tedesco da primeira fase de Senhora do Destino.”
 
 
A ‘pequena’ cresceu. Em meio às adversidades, trabalhou duro e ganhou notoriedade. Em 1996, recebeu o prêmio de melhor atriz no Festival Internacional de Cinema de Cartagena com o filme As Meninas, baseado no romance de Lygia Fagundes Telles. Também foi indicada ao Emmy Internacional na categoria melhor atriz por conta da belíssima interpretação como protagonista na minissérie Dalva e Herivelto: Uma Canção de Amor (2010). Neste trabalho arriscou a soltar a voz, assim como Carmen. Brilhou.
 
 
SÉTIMA ARTE
O seu legado nos cinemas não se restringe ao As Meninas. Também arrancou gargalhadas do público em Trair e Coçar é Só Começar (2006) e, mais recentemente, emocionou no filme Real Beleza, dirigido por Jorge Furtado. No longa, que estreou no início de agosto, contracenou, pela primeira vez nas telonas, com o marido, Vladimir Brichta. Adriana faz Anita, mulher casada com um homem bem mais velho e mãe de Maria, aspirante a modelo e escolhida pelo fotógrafo (João) para seguir carreira. Anita e João se envolvem e, por meio dela, ele, que buscava incessantemente pelo belo, descobre o real sentido da palavra.
 
 
O diretor não poupa elogios para sua atuação. “Já trabalhei com Fernanda Montenegro e sua atuação (Adriana) é muito parecida com o dela. Elas vêm da mesma ‘enfermaria’, têm o mesmo tipo de relação do trabalho. Se envolvem profundamente com aquilo e mergulham no personagem de uma maneira impressionante.” Adriana mergulha, literalmente. Tanto que uma das cenas que mais repercutiram do filme foi uma em que ela fica totalmente nua, em frente a um lago, onde seduz o fotógrafo. “Tenho certa facilidade e interesse em me colocar no lugar do outro. Imaginar uma nova vida. E meu trabalho é exatamente esse”, completa.
 
 
A idade, além da maturidade, extinguiu sua insegurança. Faz alimentação balanceada, corre na praia quando dá, mas não é uma escrava do espelho. “Gosto de mim, do meu jeito, vou vivendo. Fico feliz de pensar que não foquei minha vida numa visão estética, nem fui criada com pessoas que valorizassem isso ao extremo. Meu marido também não nem é assim que crio meus filhos. Não existe esse culto à estética, mas, para quem gosta, tudo bem.” A beleza, para ela, vai além dos traços físicos. “São atitudes, sentimentos, ações, obras que nos causem sentimentos verdadeiros. Que nos emocionem. Gosto de lembrar que a natureza e o homem podem nos provocar a real beleza.”
 


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