Superpai

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Miriam Gimenes

Ilustração: Rodrigo Bueno 

Reza o dito popular que quando nasce um bebê, nasce uma mãe. Mas e o pai? Ele não carregou a criança no ventre durante nove meses, ficou isento das dores do parto e não teve de desbravar a difícil – prazerosa e necessária – arte de amamentar. Quando ele se dá conta, então, de que aquele ‘pacotinho’ também é de sua responsabilidade e que nem mesmo Os Vingadores vão tirar do pequeno a ideia de que ele é o número 1 na lista dos heróis? Cada vez mais cedo, diga-se de passagem. A já ultrapassada premissa de que o homem trabalha e a mulher é quem cria foi aniquilada. Ainda bem. Como dizia William Shakespeare, sábio é o pai que conhece seu próprio filho.

 
Carine Valéria Mendes dos Santos, doutoranda em Psicologia Clínica pelo Instituto de Psicologia da USP, fez uma tese de mestrado para analisar essa mudança comportamental e diz que esta paternidade participativa ainda é um modelo em construção. “A entrada da mulher no mercado de trabalho estimulou o homem a participar mais ativamente no espaço doméstico, e com o casal de dedicando a trabalhos e/ou a carreiras profissionais, isso repercute em novas formas de gerenciamento das dinâmicas familiares. Trata-se de um contexto familiar cada vez mais característico da contemporaneidade e que possibilita a emergência de uma relação mais íntima entre pai e bebê/criança.”
 
Essa realidade é ótima para as crianças. Pesquisa recente feita pela Universidade de Connecticut, dos Estados Unidos, apontou que a figura paterna na infância pode ser mais importante até mesmo que a materna. E os pequenos sentem mais a rejeição se ela vier do pai. A explicação é que o papel masculino remete a prestígio e poder e, por isso, é supervalorizado. Esse resultado reafirma o que Freud deixou em seu trabalho Leonardo da Vinci e uma Lembrança da sua Infância, onde disse que ‘na maioria dos seres humanos, tanto hoje como nos tempos primitivos, a necessidade de se apoiar numa autoridade de qualquer espécie é tão imperativa que seu mundo desmorona se essa autoridade é ameaçada.’
 
E as mães, como recebem este novo pai? A psicóloga diz que elas se dividiram em dois tipos: uma adotou posição mais dominante de cuidados aos bebês e, a outra, mostrou-se cooperativa e permitiu a ajuda efetiva. “Como a maternidade, principalmente no período referente ao ciclo gravídico-puerperal, sempre foi um território dominado pela mulher, inclusive confundindo-se com a própria noção identitária do que seria uma mulher, a entrada do homem nesse território pode ser vista tanto como um desejo de obter cooperação e suporte emocional, como uma ameaça à primazia do cuidado.” O sentimento de posse, em alguns casos, pode ser prejudicial até mesmo para o relacionamento do casal.
 
O ilustrador Rodrigo Bueno transforma a experiência com as filhas gêmeas em um diário divertido que já tem 8.000 seguidores no Facebook
Foto: Arquivo Pessoal 
 
O ilustrador Rodrigo Bueno, do Rio de Janeiro. Quando se descobriram ‘grávidos’, ele e sua mulher, Grasi, ficaram superfelizes, já que um filho era planejado. Só que vieram duas: Margarida e Iolanda. Desta experiência inédita em sua vida, ele está fazendo o livro Diário Ilustrado da Paternidade: As Aventuras de Magá, Ioiô & Rodrigo Bueno, por enquanto só disponível no Facebook, com quase 8.000 seguidores. Nele, Rodrigo mostra as situações divertidas do seu dia a dia como pai e deve lançar a publicação no próximo ano.
 
Em casos como o dele, o pai não tem muito como fugir das funções. “Embora sejam duas, sou pai de primeira viagem. Vivi intensamente esse turbilhão todo. Achei um barato, na inocência do trabalhão que dava. Só agora, que elas estão chegando nos três anos, estamos conseguindo dormir a noite toda.” E a ficha, segundo ele, não para de cair. “Você deixa um pouco de ser filho, deixa de ser namorado e vira pai.” Lembra de um diálogo que ouviu entre um primo e seu tio, em que o pai disse que só havia pegado o filho no colo depois que o mesmo completou um ano de idade. “E meu primo disse: ‘você não sabe o que perdeu’. Nunca tirei isso da minha cabeça e adotei isso com as minhas filhas.” Além da proximidade do vínculo afetivo, ele diz que a oportunidade ajuda não só os pais, mas as mães também, a perceber com os cuidados daquele ser tão dependente o quanto cada um é valioso e o a vida, preciosa.
 
O escritor Renato Kaufmann diz que ser pai ' é um processo que vem de fora para dentro'
 
A rotina do dia a dia, no entanto, não foi o que mais achou dificultoso. O que o incomodou, principalmente com duas bebês, foi a necessidade de ajuda. “Isso é sempre muito invasivo porque está dentro da sua casa, que é um ninho. Você acabou de ter um filho, quer privacidade, quer lamber sua cria, e tem sempre alguém lá.” Aprender a lidar com as interferências, palpites e a ajuda – exercício apenas feminino outrora – também é algo a ser aprendido pelos pais.
 
Vezes dois
O escritor Renato Kaufmann é pai de segunda viagem: Lucia, 6, e Gael (que ele chama de Texugo), 5 meses. Da experiência fez dois livros: Diário de Um Grávido e Como Nascem os Pais? Na primeira publicação, ele conta a experiência incrível da gravidez, mas sob a ótica paterna. “O fato é que, para a mãe, a coisa vem literalmente de dentro para fora. Para o homem é um processo que vai de fora para dentro, que começa na notícia. “Tem alguns marcos para o pai se dar conta: quando vai acompanhar o ultrassom e ouve o coração batendo, é um choque. Você pensa: ‘meu filho tem um coração que bate, do tamanho de um feijão.’ Quando minha mãe trouxe a primeira roupinha, um body amarelo, a ideia física do bebê foi impressionante”, lembra.
 
Os pais, segundo ele, nascem a ‘golpes de fórceps’. Ainda assim, para Renato, é mais fácil ser pai do que ser marido. “É uma coisa mais natural. Mulheres dão muito mais trabalho que as crianças (ele é separado da mãe de sua filha). Acho que a parte difícil (da paternidade) são os sustos, ver a criança passar mal, ter febre, vomitar sem parar, fico em pânico.” Ain


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