Fio de cabelo

Envie para um(a) amigo(a) Imprimir Comentar A- A A+

Compartilhe:

Vinícius Castelli

Nos anos 1980, um certo corte de cabelo, com um rabicho longo na nuca e fios repicados e volumosos no topo da cabeça, foi rebatizado. Conhe­cido até então como mullet, passou a ser chamado, pelo menos no Brasil, de  ‘chitãozinho’, uma alusão à dupla sertaneja de maior sucesso à época, Chi­tãozinho e Xororó, que ostentava o tal penteado. Eles não só marcaram uma geração com o estilo caubói – cal­ças justas, botas e chapéu – como também mudaram os rumos da história da música sertaneja, em 1982, com uma canção que não poderia ter outro nome: Fio de Cabelo, de Darci Rossi e Marciano. O sucesso foi tanto que a du­pla vendeu 1,5 milhão de cópias do álbum Somos Apai­xonados, e rompeu as barreiras do preconceito contra o gênero. Não à toa, as gerações seguin­tes – até mesmo de outros ritmos – os apontam como referência e reverenciam a história que construíram ao lon­go de mais de quatro décadas de carreira. 

José Lima Sobrinho, 61, e Durval de Lima, 58, tiveram seu primeiro contato com a música por conta de seus pais, seu Marinho e dona Araci, que escutavam canções em ca­sa. Não imaginavam que tri­lhariam caminho tão belo e respeitoso neste universo.  Além dos muitos fãs que conquistou, a dupla faz questão de ajudar os novos artistas. Ecléticos, vão além. Não refutam nenhum gênero musical. Já subiram ao palco ao lado do maestro João Carlos Martins e da Orquestra Bachia­na Fi­lar­mônica Sesi-SP, cantaram com Djavan, e até fizeram parceria com músico de São Bernardo Andreas Kisser, guitar­rista  da banda  Sepultura.
Homens que torcem por um Brasil mais justo, Chitãozinho e Xororó são orgulhosos de sua trajetória. Foram 37 milhões de discos vendidos, 36 álbuns inéditos, oito DVDs, três prêmios Grammy, centenas de discos de ouro, platina e diamante, programas de televisão e homenagem no samba-enredo da X-9 Paulistana em 2005. Neste ano, em que lançou o álbum Tom do Sertão, que presta homenagem ao maestro e compositor Tom Jobim, a dupla completa 45 anos de estrada, de plantio e colheita de trabalho duro e já pensam na comemoração dos 50. Confira, a seguir, entrevista exclusiva à Dia-a-Dia. 
 
 
Gostaria de saber como a música entrou na vida de vocês. Lembram-se de quando ela chamou a atenção? Olhando para trás, dava para imaginar que chegariam tão longe?
Xororó – A música entrou nas nossas vidas por meio de nossos pais, que sempre cantavam em casa. Começamos a cantar em festas juninas e clubes de Rondon, no Paraná, onde passamos nossa infância. Nós sempre batalhamos muito para conquistar nossos objetivos, mas não imaginávamos que chegaríamos onde estamos hoje, e damos muito valor a tudo o que conquistamos. A nossa parceria dá certo porque sempre lutamos juntos para sermos reconhecidos pela nossa música. Neste ano, vamos completar 45 anos de carreira, então já estamos pensando em comemorar os 50 (risos).
 
O que dá mais orgulho quando olham para a carreira de vocês?
Chitãozinho – Temos muito orgulho de toda nossa trajetória. Em muitos momentos tivemos dificuldades, mas mesmo assim persistimos. Um dos momentos que mais nos orgulhamos foi na época da música Fio de Cabelo, que rompeu as barreiras do preconceito ao gênero sertanejo, nos projetou como artistas nacionais e representou também um marco na história da música sertaneja como um todo. O gênero passou a ser tocado em rádios FM (eles foram pioneiros nisso), começou a ter espaço nos programas de televisão, algo que os sertanejos não faziam naquela época. O número de shows também aumentou significativamente.
 
Vocês sempre deram espaço para artistas mais jovens. Quando sentiram a necessidade ou vontade disso?
Xororó – Acreditamos que devemos dar oportunidades para os artistas que estão iniciando a carreira, pois eles têm muito a nos ensinar também. Existem artistas muito talentosos dessa nova geração, como o Fernando Zorzanello, da dupla Fernando & Sorocaba, que nos ajudou a produzir nosso mais recente DVD, Do Tamanho do Nosso Amor.
 
Houve alguém que ajudou muito vocês na carreira?
Chitãozinho – Recebemos muita ajuda do radialista Geraldo Meirelles, que acreditou no nosso potencial. Ele, inclusive, foi quem nos rebatizou de Chitãozinho & Xororó (éramos conhecidos como Irmãos Lima). 
 
É fato que há preconceito na música, em todos os gêneros. Já vimos vários casos de vaias em diversos festivais e outros fatos. Na visão de vocês, qual o motivo disso acontecer?
Chitãozinho – Isso acaba acontecendo porque muitas pessoas não se permitem conhecer outros estilos e julgam precipitadamente. Nós ouvimos de tudo um pouco, de Roberto Carlos a Mumford and Sons. Sempre procuramos nos atualizar e respeitamos todos os estilos, sabe? Estamos antenados ao que acontece no mercado.
 
Falando nisso, vocês sempre levantaram bandeira contra o preconceito musical. Tanto que já tocaram com Andreas Kisser, levaram a canção sertaneja junto de orquestras, como com o maestro João Carlos Martins. Como é isso?
Xororó – Nós gostamos muito de misturar estilos, inovar, surpreender nosso público, fazer parcerias e mostrar nosso trabalho. Acreditamos que a música pode ser construída a partir da mistura de estilos e somos a prova de que essa interação com outros gêneros dá certo. Misturamos a música sertaneja com a clássica, como você mencionou, e combinou muito bem. Essa mistura nos rendeu até um Grammy Latino. Ganhamos o prêmio de melhor álbum de música sertaneja com Chitãozinho & Xororó 40 Anos Sinfônico, que gravamos na Sala São Paulo junto com a orquestra Bachiana Filarmônica Sesi-SP, o maestro João Carlos Martins, e convidados como Maria Gadú, Fábio Junior, Fafá de Belém, Djavan, Alexandre Pires, Jair Rodrigues, Sandy, Junior Lima e Caetano Veloso. Ade­quamos nosso repertório para esta mistura e conseguimos casar.
 
E agora vocês levaram a música sertaneja para o universo de Tom Jobim. Foi um passo ousado e muito bem pensado, né? Deu um frio na barriga em algum momento?
Chitãozinho – Todo projeto novo dá certo frio na barriga. Estamos falando da obra do grande Tom Jobim, portanto, tivemos que tomar todo o cuidado para não tir


Diário do Grande ABC. Copyright © 1991- 2024. Todos os direitos reservados