Boneco sem alma

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Luís Felipe Soares <br> Do Diário do Grande ABC

O filão de produções de terror que ganham remake não para de aumentar. Entre altos e baixos atingidos pelas recentes obras, Hollywood tem tempo e dinheiro de sobra para fazer suas apostas e tentar surpreender – e assustar – o público disposto a se divertir com o medo. O mais recente capítulo desse tipo de gênero é versão remodelada de Brinquedo Assassino, modernizando toda a história e cujo resultado pode ser conferido nas salas brasileiras a partir de hoje, incluindo cópias nos complexos do Grande ABC. Mudanças descaracterizam quase que por completo toda a história e o personagem principal na esperança de fazer o boneco símbolo realmente assustador para a nova geração, uma vez que espectadores antigos devem deixar a sala com perplexidade diante das alterações.

Originalmente colocado nas telonas no mercado internacional em 1988, chegando ao circuito nacional na temporada seguinte, o filme não foi recebido inicialmente como um grande sucesso. O bom número obtido pela bilheteria lhe renderia duas sequências diretas e quatro filmes que expandem o universo em torno do personagem principal. Tudo se relaciona a Chucky e seu carisma perverso, que ganha força na medida em que se trata de assassino canastrão com pouco mais de um metro e altura, cabelo ruivo e roupa infantil.

Depois de tantos longas-metragens, acaba ficando difícil lembrar de sua origem. Na primeira obra oitentista, um assassino está prestes a morrer dentro de uma loja de brinquedos e usa seu conhecimento de magia maléfica para transferir sua alma para o boneco, com sua nova forma de plástico passando por cima de qualquer obstáculo e pessoa para tentar repassar seu espírito para um garoto. Apesar de bizarro, o criativo conto ganhou fama e lendas ao longo de mais de 30 anos.

Tudo disso foi deixado de lado no trabalho atual do diretor Lars Klevberg (responsável pelo pouco conhecido Morte Instantânea). Não há espaço para elementos sobrenaturais nem conexões entre humanos e coisas inanimadas. Acaba sendo espécie de apresentação literal do título brasileiro, com o foco sendo um verdadeiro brinquedo assassino. Desta vez, Chucky é a forma externa de inteligência artificial cujos recursos de segurança foram desativados e ele não percebe limites para tentar agradar o novo amigo Andy (Gabriel Bateman). O que parece somente estranho no começo se revela uma tecnologia abrangente, aparentemente incontrolável e obcecado na missão de se conectar com o garoto humilde sofrendo por problemas de relacionamento com a mãe (Aubrey Plaza, descaracterizada em papel materno). Claro que o estilo da criatura robótica mantém o essencial infantil do passado, mas com rosto completamente modificado e sempre estranho.

Pode parecer piada pronta, mas o remake sofre por falta de alma – mesma que ela fosse de um criminoso sem escrúpulos pronto para matar pessoas no corpo de um boneco. Os assassinatos são bem mais fortes do que os mostrados no original e brincam com o fato de que o responsável não tem sentimentos diante das vítimas. A ideia de explorar os rumos digitais dos brinquedos na atualidade pode ter soado interessante no momento de se escrever o roteiro, com as ideias talvez se saindo melhor se não estivesse diretamente conectado a uma obra já existente. O Chucky zombaria de sua remodelagem, com o novato não fazendo ideia de quem seria seu agressor.




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