'Só precisei de uma chance'

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Miriam Gimenes

Os gregos foram pioneiros na arte de cortar os cabelos. Os primeiros salões – koureias – eram construídos nas praças públicas de Atenas. Os ’magos das tesouras’, chamados à época de embelezadores de cabelos, eram benquistos e muito procurados pela população. Passaram-se anos e o prestígio destes profissionais não mudou. Renata Mendes, 37, que nos diga. No salão recém-inaugurado em Santo André, são mais de 100 clientes fixas que confiam a ela o destino de suas madeixas, um dos maiores símbolos da vaidade feminina. Para alcançar este status, no entanto, o caminho foi cruel, mas extremamente válido. “Sempre digo: ‘Abrace uma oportunidade como se fosse sua única chance na vida e foi o que eu sempre fiz. Só precisei de uma para conquistar o que quis.”

 
E o que almejava? “Perdi meu pai muito cedo e, desde então, meu objetivo era vencer na vida. Não sabia como, achava que se eu viesse para São Paulo quando fizesse 18 anos eu ia ganhar muito dinheiro, ia tirar minha mãe da situação muito difícil que ela vivia.” Renata é mineira e perdeu o pai, um político e fazendeiro importante de sua cidade, ainda criança. A mãe, muito jovem, não tinha como sustentar ela e os outros filhos por complicações da herança. Casou-se novamente e a família foi morar na roça. “Se vejo um boia-fria sei o que é aquilo, vivi tudo isso. Eu não escolhi passar, mas passei. Carreguei lata d’água na cabeça, lavei roupa no rio. Conheço tudo isso e agradeço a Deus por conhecer”, lembra.
 
 
O fato é que, assim que completou a maioridade, veio para São Paulo e viu que a vida não seria tão fácil como sonhou. Morou de favor, trabalhou como caixa de supermercado, casou, teve dois filhos e quando a mais nova tinha 9 meses, se separou. Foi nessa época que começou a trabalhar em um salão da Rua Marechal Deodoro, em São Bernardo, como manicure. “Desde então, peguei gosto pela coisa. Passei também a depilar, tudo sem poder fazer curso. Eu ia aos lugares como cliente, prestava atenção como as pessoas atendiam, chegava em casa, pegava as amigas, chamava as vizinhas e treinava.” Passou por salões famosos da região até que, por necessidade de quem precisa sustentar dois filhos, abriu o seu. O dinheiro de uma só função não aplacava suas contas. Nascia assim o Studio Renata Mendes, há oito anos. Neste meio-tempo, conheceu o segundo marido, que a apoiou na empreitada.
 
Começou com uma cadeira – seu xodó, a acompanha até hoje –, um lavatório e uma maca, no fundo de uma casa. “Comprei e não sabia como ia pagar, porque era um dinheiro que não existia. Fiz em dez suaves prestações. Para minha surpresa, todas as clientes que tinha no salão chique vieram atrás de mim para fazer unha e depilação. Isso me sustentou por um bom tempo.” Conseguiu também custear cursos, já que tinha sido autodidata até então. Depois surgiu a oportunidade de abrir um salão no aeroporto de Campinas, que só lhe rendeu dor de cabeça.
 
NOVOS ARES
Do salão que tinha em São Bernardo, mudou-se para o bairro Jardim, em Santo André. Ficou nesta casa por dois anos e, há pouco, migrou para outra maior, em frente ao antigo estabelecimento. “Foi muita determinação minha, nunca pensei em desistir. Hoje paro, olho para trás e me pergunto: como cheguei até aqui? Foi trabalhando. Não ganhei nada, não casei com marido rico, não ganhei na Mega-Sena, não tive herança de família. Foi muita luta”, diz, emocionada. E acrescenta: “Existe sim a depressão, mas sou incrédula das pessoas que reclamam muito de muito pouca coisa. É mais fácil deitar na cama e se entregar.”
 
É por isso que valoriza cada cliente que entra em seu salão, até porque a primeira impressão é a que fica, e tenta motivar ao máximo seus funcionários. “Sempre fui uma pessoa que pensou positivo. Por mais difícil que as coisas andem, tudo é muito movido a energia. Se você está batalhando para crescer e tem uma pessoa que tem energia negativa, esse pensamento atrai coisa ruim.” Renata diz amar o que faz, transformar as pessoas, deixá-las felizes. “Tento dar o máximo para que meu cliente saia satisfeito e sou muito verdadeira.”
 
E o mais importante: hoje a empresária tem know-how para opinar em todas as funções oferecidas no Studio. “Salões abrem aos montes por aí. Mas o diferencial não é só ser a dona, mas a mão de obra qualificada no meu negócio.” A cabeleireira que saiu de Minas Gerais ainda menina com um objetivo o conquistou, de fato. “Conto a minha história com muito orgulho e não sou nenhuma coitada porque, graças a Deus, consegui, enfim, vencer”, finaliza.
 



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