O quê move os Black blocs

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Evaldo Novelini

É possível que o leitor, ao menos aquele que se informou sobre o movimento apenas pelo que falaram dele jornais, revistas e emissoras de televisão e rádio de grande audiência, leve choque ao concluir as 288 páginas de Mascarados – A Verdadeira História dos Adeptos da Tática Black Blocs. O livro, que a Geração Editorial manda às lojas por R$ 34,90, será lançado hoje, a partir das 19h, na livraria Saraiva do Shopping Pátio Paulista, na Capital.
 
A tese do livro, escrito a seis mãos, duas delas pertencentes a Willian Novaes, ex-repórter do Diário, contraria a imagem de grupo de arruaceiros sem rosto e causa que deslegitimaram as manifestações que sacudiram o Brasil em junho de 2013, inicialmente contra o aumento de tarifas do transporte. Os black blocs só partiram para a violência em resposta à repressão do Estado à proposta de diálogo por melhores serviços públicos. No manifesto da turma, aliás, a polícia é tratada como amiga, mas só até o momento em que se torna opressora. O uso da força, geralmente depredação de bens privados, é admitido contra grandes corporações, que explorariam o trabalhador.
 
Posfácio assinado pelo professor universitário Pablo Ortellado enxerga, inclusive, raízes pacifistas nos mascarados. Ele lembra que o movimento ganhou seu contorno atual durante os protestos de 1999 contra a Organização Mundial do Comércio, em Seattle, nos Estados Unidos. Foi ali que “um grupo optou por romper com a tática de bloquear ruas e praticar resistência passiva, na tradição de desobediência civil não violenta de Gandhi e Martin Luther King Jr.”.
 
Os autores, entre eles o repórter Bruno Paes Manso, que cobriu a agitação de perto, não glamorizam os manifestantes e reconhecem os excessos praticados. Jornalistas, por exemplo, eram frequentemente alvos dos black blocs, que os confundiam com defensores da ideologia dos donos dos grandes impérios de comunicação, acusados de serem tendenciosos e mentirosos.
 
Boa parte da pesquisa sobre a gênese dos black blocs no Brasil se deve ao destemor da cientista social Esther Solano, uma das coautoras, que se infiltrou nas manifestações desde 1º de agosto de 2013, em São Paulo, para buscar a motivação dos jovens que saíam às ruas protestando. Naquela data, por exemplo, a turma queria saber aonde estava o ajudante de pedreiro Amarildo Dias de Souza, trabalhador fluminense que, pouco antes, desaparecera sob suspeita de ter sido executado por policiais.
 
Um ano de trabalho de campo permitiu que Esther concluísse que não se trata de movimento encabeçado apenas por jovens inconsequentes. Há, entre os manifestantes, adultos de 30 anos, vários deles pais de família com crianças pequenas – alguns do Grande ABC, como relata Esther.
 

O livro traz alerta importante às autoridades. Os black blocs se retiraram da cena, mas o ódio que sentem e os ideais que os movem seguem sem solução. “Desencantamento absoluto com a política, raivas pessoais, raiva intensa contra a polícia. A raiva não foi resolvida, foi piorada pelo absentismo macabro dos diversos níveis de governo que jogaram na polícia uma tarefa que não era dela. O problema da raiva é que ela cresce e se espalha pelo conjunto social muito rápido, porque sempre encontra ótimos disseminadores”, adverte Esther. 




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