Bastidores do Sexo

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Vinícius Castelli

 “Aqui a gente trabalha 24 horas. Sexta, sábado e domingo têm mais movimento. Durante a semana, quem vêm são os amantes”

Todo mundo sabe ou, pelo menos, imagina o que acontece nos motéis. O local é escolhido por quem busca realizar fantasias sexuais, algumas bem românticas, outras bem sacanas, mas todas protegidas por um elemento essencial: a privacidade. E assim como todo serviço, o consumidor também quer sair de lá satisfeito pelo valor pago.
Para garantir a comodidade, o conforto e a tal intimidade, o segredo do colaborador dos estabelecimento é dedicar-se ao negócio e gostar do que faz. Ele realmente precisa trabalhar com prazer já que poucos lugares funcionam 24 horas por dia. Para não decepcionar o cliente, são treinados, seguem lista de tarefas, capricham na limpeza e – por que não ? – no cardápio. Afinal, depois da ‘obrigação’, nada melhor do que matar a fome.

Curiosa que é, a equipe da revista Dia-a-Dia acompanhou uma tarde de trabalho em um dos motéis do Grande ABC. Para compor a reportagem, também ouviu relatos de fatos engraçados e alguns trágicos, vividos por quem já adentrou pelas portas trancadas a sete chaves destes estabelecimentos. E, você, tem alguma história que gosta de lembrar ou faz questão de esquecer? 

O motel andreense capitaneado pelo gerente Adeilton de Oliveira há 21 anos possui 56 suítes e recebe cerca de 110 veículos por dia. “Aqui a gente trabalha 24 horas. Sexta, sábado e domingo têm mais movimento. Durante a semana, quem vêm são os amantes”, brinca o funcionário que vive, literalmente, no local do serviço. São 40 pessoas trabalhando diariamente, todas registradas de acordo com as regras da CLT. “A tarefa não é fácil, mas a gente se diverte. Tem até uma churrasqueira no fundo para os funcionários”, conta.

A rotina de limpeza é, como se pode imaginar, uma das mais árduas. A camareira Giselle Matias Braga revela que a maioria dos hóspedes não deixa o quarto organizado, esquece de jogar os preservativos no lixo e de pendurar as toalhas no lugar certo. A funcionária diz ainda que já encontrou cenários piores. “Já fizeram necessidades na banheira, no ralo do chuveiro. Um nojo. Ás vezes, largam produtos eróticos jogados”, explica.
Pensando em deixar tudo mais asseado até do que muitos hotéis por aí, alguns motéis têm o costume de realizar faxinas extras. Além da arrumação entre uma entrada e outra de casais, os quartos passam por faxina completa e descansam por 48 horas, com a janela aberta para tomar ar. “Quando liberamos estas suítes, abrimos uma de outra ala. Fazemos um rodízio”, explica o gerente Adeilton.

Outra curiosidade é o fato de o estabelecimento comprar água de caminhão-pipa para abastecer chuveiros, piscinas e banheiras. Água da rua é só para lavar a roupa. E olha que não é pouca. Lucineide Maria Gomes trabalha na lavanderia com grande maquinário. Ela é um dos colaboradores que cuidam dos lençóis, toalhas de banho e rosto, e fronhas. “Às vezes, a toalha chega manchada, mas é difícil alguém estragar alguma coisa”, explica Lucineide, que nem tem ideia de quanta roupa lava por dia. “Se quebrar uma das máquinas ‘a casa cai’”, arremata Adeilton.

Em relação aos constrangimentos que os funcionários estão propensos a passar trabalhando em um local onde as pessoas deixam transparecer os desejos mais privados, a camareira Giselle confessa que tinha vergonha quando começou no cargo. Certa vez, teve de ‘se acostumar’ com um homem que se hospedava sozinho e, de vez em quando, ia até a janela do quarto para mostrar as partes íntimas. Ela também ficava constrangida com os gritos que ouvia vez ou outra nos corredores do local. “Era até engraçado, mas me acostumei.” Agora a funcionária acredita que os clientes estão mais do que certos. “Aqui é para relaxar e extravasar mesmo. O ‘ai ai’ para cá e ‘ui ui’ são normais.” O arder da paixão é tão intenso ou o cansaço depois da brincadeira é tão excessivo que muita gente só não esquece a cabeça porque está grudada no pescoço. “Já encontrei calça, colar, camisa. Uma vez um casal deixou as alianças. Eles voltaram para buscar e me deram até gorjeta”, comemora.

ECONOMIA

A região conta com 64 motéis cadastrados no Sehal (Sindicato das Empresas de Hospedagem e Alimentação do Grande ABC). Santo André possui 18, São Bernardo 27, Mauá e Diadema contam com sete, Ribeirão Pires tem quatro e São Caetano possui uma unidade. De acordo com Roberto Moreira, presidente do sindicato, a importância desse mercado para a economia da região interfere diretamente na geração de empregos, renda e impostos, além de servir como apoio a rede hoteleira e turismo. Por isso, diversos estabelecimentos aceitam que pessoas entrem sozinhas. “O mercado de motéis ainda é procurado por novos empreendedores. Trata-se de grande investimento, com boa rentabilidade”, conta Moreira. 

Os responsáveis pelo cardápio capricham nas receitas com saladas, massas, carnes, aves e peixes. Foto: Claudinei Plaza

COMER E COMER
Há ditado que diz que a cozinha entrega muito a respeito do local. O que a reportagem viu foi um lugar bem-arrumado, chão impecável, produtos bem refrigerados e organizados. Edna Garcia e José Alberto, o Beto, estão no comando de uma das duas grandes cozinhas e do preparo dos pratos, drinques, sucos e cafés da manhã. Ela está lá há um ano, ele há uma década. Beto conta que trabalha das 7h às 17h e, que no horário do almoço, a demanda aperta. “O que mais pedem aqui é estrogonofe e filé à parmegiana.” Seguindo o conceito do sigilo, os pratos passam discretamente pela portinha que liga o corredor aos quartos.

O farto cardápio conta com diversos tipos de saladas, massas como caneloni e rondele, carnes e aves, além de receitas preparadas com peixes. Estão na lista posta de salmão ao molho de laranja acompanhado por batata sauté e arroz com brócolis ou posta de badejo ao molho de camarão, ambos provados



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