Comendador e outras histórias

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Andréa Ciaffone

Tem gente que é uma coisa só mesmo sendo muitas diferentes. Alexandre Nero é uma dessas pessoas. Ao mesmo tempo em que se mistura às figuras que cria para a televisão – de verdureiros a comendadores – seu carisma pessoal transborda pelos poros dos personagens para conquistar o público. É o tipo de sujeito que faz os homens o classificarem como boa companhia em uma mesa de bar e, ao mesmo tempo – coisa rara! –, é o cara que inspira as mulheres (de todas as idades) a imaginar como seria preparar o café da manhã para ele.

Divulgação
José Alfredo, Império (2014)

Nero virou unanimidade porque sempre surpreende em alguma medida. É daqueles seres especiais que sabem misturar deboche com lirismo, humor com seriedade, macheza com sensibilidade. A prova destas intrigantes combinações está na tela da TV de segunda a sábado, na novela das 21h da Rede Globo. Em Império, o ator vive o protagonista José Alfredo, homem que só se veste de preto em luto eterno causado por uma decepção amorosa e que, sem querer ou planejar, se vê diante de uma possibilidade de construir um império. E o faz.

O papel tem o significado de coroar mais de 20 anos de carreira dedicados à arte. Além de ator, Nero é compositor, músico, cantor e diretor musical. Como músico e ator, acumula 50 trabalhos em espetáculos de teatro, cinema, TV, dança e música, pelos quais conquistou mais de uma dezena de prêmios. E aí vem a versatilidade do gajo: além de vencer por sua atuação – alguns títulos de grande repercussão, como melhor ator em 2010 pelo Jornal O Globo, ator revelação em 2008 no Programa do Faustão – ganhou melhor espetáculo no respeitadíssimo festival de Teatro de Curitiba pela peça Os Leões, em 2006. Em 2002, foi o melhor cantor do Estado do Paraná e, em 2001, carregou para casa três troféus: o de melhor CD, letrista e cantor. E, em meio a tudo isso, ainda encontrou tempo para idealizar e fundar a Associação dos Compositores da Cidade de Curitiba, em 1994.

Toda a facilidade em transitar por teatro e música revela-se em seus trabalhos autorais, como no documentário musical ‘Revendo Amor com Pouco Uso, Quase na Caixa’, lançado no fim de 2013. Vestindo camisa bicolor com gravata borboleta, fraque e cartola, o ator e músico caminha ao lado de uma banda fazendo evoluções com um bastão, numa imagem ao mesmo tempo engraçada e poética. A performance dá o tom do filme, que alterna a interpretação de canções de amor com as suas reflexões pessoais sobre o tema numa reunião de pré-produção do trabalho. Nesses momentos, a tal sensação de que ele seria um boa companhia para tomar uma cervejinha se confirma.

Assim, mesmo depois de um dia intenso de gravações de Império, Alexandre Nero provou ser um cara ‘papo firme’ ao conceder entrevista exclusiva para a Dia-a-Dia em que fala sobre sua trajetória de artista múltiplo, sobre o personagem José Alfredo, seu momento profissional e todos os desafios que ele traz.

Divulgação/Globo
Vanderelei, A Favorita (2008)

DIA-A-DIA – Você sempre trabalhou com música e atuação ou teve uma fase de emprego convencional?
ALEXANDRE NERO
– Já tive emprego com carteira assinada. Mas, por curiosidade, vale dizer que existem músicos e atores que também trabalham com carteira assinada. São profissões regulamentadas e reconhecidas juridicamente. Mas não foi o meu caso. Trabalhei como bancário e em telemarketing até os meus 18, 19 anos (hoje Nero tem 44 anos). Tenho, basicamente, uns três ou quatro anos de carteira assinada. A partir daí fui para a música e teatro, alternando sempre as duas artes.

DIA-A-DIA – Como foi sua passagem da música para o teatro, e depois para a televisão?
NERO
– A TV entrou na minha vida meio que por acaso. Na verdade, o teatro também. Como músico, me chamaram para um teste para um musical. Fui na audição sem nenhuma pretensão de virar ator. Como era um musical, tinha que cantar, então acabei passando. Gostaram do meu trabalho, foram me chamando para outros e assim foi indo. Nisso se passaram 20 anos e eu me tornei ator nesses 20 anos. Fui fazendo muitas e muitas peças e, numa dessas montagens no Festival de Teatro de Curitiba, um produtor de elenco da TV Globo me viu numa peça (Os Leões) que estava dando muita repercussão, foi premiada e viajou para São Paulo e Bahia. Ele me chamou para participar de um pequeno programa, depois para fazer um teste e eu acabei passando na seleção para A Favorita, minha primeira novela. E aí foram me chamando para uma coisa aqui, outra alí e as coisas foram acontecendo naturalmente.

DIA-A-DIA – Como foi a construção do José Alfredo? Quanto veio do Aguinaldo Silva e quanto você mesmo construiu?
NERO
– Isso é muito complexo. Na verdade, eu sabia bem pouco dele. Uma sinopse de personagem de novela tem cinco, seis, dez linhas no máximo. É pouca informação para definir uma pessoa, um personagem, um ser humano. Eu sabia que ele só se vestia de preto, foi muito pobre e ficou bilionário, se apaixonou pela mulher do irmão e que misturava expressões em inglês com português. Preencher o que pode estar nas entrelinhas faz parte do trabaho do ator. Coisas como a maneira como ele trata os outros. José Alfredo tem coração bom, porém é um cara casca-grossa, sem muita frescura. Fui trazendo essas características para o personagem, fui experimentando. A interação com outros atores, direção e produção de elenco são importantes. As pessoas começam a trocar muitas ideias e a gente vai construindo os vários personagens (de uma novela) juntos.

DIA-A-DIA – Embora o Comendador seja um protagonista, cheio de dramas para cuidar, ele tem um toque de humor especial, uma impaciência charmosa que o faz uma pessoa, não um personagem. É preciso muita disciplina para não cair no humor, algo natural em você?
NERO
– É p



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