Príncipe à brasileira

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Miriam Gimenes

Dom João é trineto de D. Pedro II e bisneto da princesa Isabel

Habitué nas rodinhas de surfistas cariocas da década de 1970, Dom João de Orleans e Bragança, 60 anos, ficou conhecido como João Príncipe. A alcunha não é mera brincadeira entre amigos – entre eles, o cantor e ator Evandro Mesquita e o famoso Menino do Rio, Petit –, mas sim uma alusão ao seu título real, visto que é trineto de Dom Pedro II e bisneto da princesa Isabel. Apesar da nobre ascendência, ele não ostenta a nomeação honorífica. Usa de seu sobrenome somente para lutar pelo bem do País, descoberto por seus conterrâneos há exatos 514 anos. É um fidalgo ‘tupiniquim’: surfista, fotógrafo, ambientalista, empresário e, principalmente, brasileiro.

Orgulhoso dos ensinamentos herdados da Família Real, como o de servir à nação sem ter regalias – não recebe laudêmio nem possui passaporte diplomático –, João é um ferrenho defensor de mudanças na política nacional. Em palestras que faz pelo País, discute sobre os problemas brasileiros e disseca o conceito de democracia, distorcido aqui, em sua visão. A vontade popular é esmagada pelo Poder Executivo que, para ele, é gerenciado por pessoas que não têm ideais voltados ao bem comum. “Temos quadrilhas nos ministérios e estatais”, dispara.A regra é a busca do poder.

Pai de João Phillipe, 28, e Maria Cristina, 25 – portadora da síndrome de Down –, ele revela ter aprendido muito com o nascimento da filha, que venceu os preconceitos e é autora de dois livros. “Antes de ela nascer, eu sempre fui um pouco alternativo. Com 15 anos, ao invés de ir para clubes de elite, fui à praia pegar onda, e neste meio tinha gente pobre, de classe média e rica. Na praia é todo mundo igual.”

Confira a seguir as fotos e opiniões de um nobre que não titubeia em arregaçar as mangas – como fez para ajudar os desabrigados de Teresópolis e Nova Friburgo, em janeiro de 2011 – para defender aquele que é, de nascimento e coração, o seu País. Com a palavra, o príncipe.

DIA-A-DIA – Há um senso comum de que algumas das mazelas brasileiras são consequência da colonização portuguesa. Mas há também a questão do desenvolvimento que chegou com D. João VI em 1808. Como integrante da Família Real, de que maneira avalia essas percepções acerca da influência que Portugal teve sobre o Brasil, inclusive hoje em dia?
DOM JOÃO DE ORLEANS E BRAGANÇA – José Murilo de Carvalho, grande historiador, disse em algumas entrevistas uma coisa interessante: ‘É fazer muito pouco caso do povo brasileiro botar culpa nos portugueses depois de 500 anos’. A gente adora um bode expiatório. Os ingleses, por exemplo, sugaram a Índia enquanto puderam até Gandhi aparecer e, pacificamente, derrubar o grande império inglês. Cada caso é um caso separado, não tem nada a ver com a colonização portuguesa. Falta determinação nossa para mudarmos. Hoje em dia institucionalizou-se a corrupção e, por isso, ocorreram manifestações no ano passado. Chegou-se a um ponto inacreditável. Preocupa-me a saúde da democracia. Há pesquisas que apontam que a população está insatisfeita. O incrível é que 67% das pessoas querem que mude e 37% querem que mude com ela (Dilma). Estamos sem pai e sem mãe. E mais: com a ditadura surgindo na Venezuela, a Argentina quase igual, com fechamento de jornais, cerceamento de importações de papel, isso tudo me preocupa em relação ao Brasil. Apesar de sermos institucionalmente mais fortes, mesmo assim temos de ficar de orelha em pé.

DIA-A-DIA – Laurentino Gomes disse que, para justificar a República, a Monarquia teve de ser rechaçada. Concorda com essa afirmação? Acredita que a República foi a melhor escolha para o Brasil?
DOM JOÃO – Não veio uma República para o Brasil. Ela já nasceu torta porque foi um golpe militar apoiado pelos latifundiários. A diferença é que antes era um governo civil e tinha liberdade de imprensa, expressão e política. Ela cortou as liberdades. Foi melhorando, fomos aperfeiçoando, mas estamos perdendo a democracia. (José) Sarney já foi xingado pelo Lula, (Fernando) Collor também. Agora, estão todos amigos. O presidente mais popular do Brasil vai à casa de um sujeito que é preso se sair do País (Paulo Maluf). Vemos hoje a maior decadência que pode haver na política: o PMDB chantageando o governo porque quer cargos. Agora, ela (Dilma) tirou seis ministros há quatro anos e voltou o mesmo grupo, porque não consegue governar sem essa quadrilha. Temos quadrilhas nos ministérios e estatais. Não tenho partido político, não quero a volta da Monarquia, falo isso pela educação que tive de cidadão brasileiro. Estou absolutamente revoltado com o que estão fazendo com o País. E faltam mais vozes para falar alto isso. Vale dizer que não são todos. Há grandes homens públicos, como Cristovam Buarque (PDT), Eduardo Suplicy (PT), Pedro Simon (PMDB), mas a corja tomou conta.

DIA-A-DIA – Nem todo mundo sabe que você é um príncipe real. Quando são avisadas da denominação, como as pessoas reagem? Como você se sente nessas situações?
DOM JOÃO – A grande diferença (em ser príncipe) talvez seja que fui educado de que o Brasil vem em primeiro lugar, antes da família, de nós próprios, da pessoa, em tudo. Esta é a grande herança que tive e passo para meus filhos. Minha postura é a mesma de 99% da população: queremos o bem do País. Acho que, ultimamente, depois do bicentenário da chegada (da Família Real, em 1808), começaram a sair livros, ter matérias em programas de televisão e muitas pessoas passaram a se interessar pela história e pela nossa identidade.

DIA-A-DIA – A história brasileira é cheia de caricaturas, inclusive da família real. Acredita que elas têm um pouco de verdade ou são uma forma de marcar os personagens importantes da história, como é o caso de D. Pedro I, conhecido popularmente como mulherengo?
DOM JOÃO – Acho que o brasileiro é muito irreverente. Isso vem com a simpatia e hospitalidade. Fez-se essa coisa de Dom Pedro I ser pegador, mas isso acontecia porque na época era proibido se divorciar.



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