Fé que move e revela talentos

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Miriam Gimenes

Anderson pretende transformar a A.R. Live na maior empresa de entretenimento da América Latina

Se não nascer em berço de ouro, as chances de uma pessoa ficar milionária são mínimas. Principalmente para o trabalhador comum, que recebe um ou dois salários-mínimos. Este só atingirá quatro dígitos em sua conta bancária se economizar com muito esforço ou se tiver a sorte de ser o único entre 50 milhões de apostadores a acertar os seis números da Mega-Sena. Mas ainda há uma terceira possibilidade: a de simplesmente ter fé na vida. É a essa virtude teologal que o empresário Anderson Ricardo – o mesmo que lançou Luan Santana em 2009 e o transformou em um dos maiores cantores do Brasil –, dono da A.R. Live, atribui o enredo de sua história, que em breve será contada em livro. “Sempre fui movido a sonhos e desafios, desde os 10 anos. É isso o que me faz não desistir. E que me fez não voltar para Guaimbê.”

Retornemos ao ano de 1991. Anderson, com quase uma década de vida, e a irmã, três anos mais nova, veem-se diante de um drama familiar: os pais se separaram por conta de uma traição e a mãe foi morar com outro homem. Pode parecer uma situação corriqueira para os dias de hoje, mas para uma cidade à época com pouco mais de 3.000 habitantes – Guaimbê, no interior de São Paulo –, na década de 1990, foi um escândalo. O juiz, então, determinou que as crianças deveriam ficar com a avó paterna – pois o pai era dono de bar – e os pequenos, embora adorassem a avó, sofreram muito com a situação. Anderson só pensava em ir embora de lá.

Um pouco antes deste episódio, o pequeno já havia colocado na cabeça que precisava conhecer o mundo. “Tinha uma tia que brincava dizendo que eu devo ter sido trocado na maternidade, porque eu tinha pensamentos diferentes dos outros meninos de minha idade”, lembra.

Anderson foi até o trevo da cidade, onde passava a BR-153 (Belém-Brasília), e apontou para o lado direito, perguntando a um senhor que passava no local para onde seguia a estrada. Ele respondeu que ia para Goiás. “Desde então, eu pensava que, quando crescesse, para ganhar dinheiro, teria de ir até lá.” Tempos depois, também estabeleceu como meta de vida nunca trair, já que conhecia a dor que isso causava. Em seus planos, seria um grande empresário, formaria família e se portaria como um excelente pai.

Aos 12, tentou fugir com um circo, mas foi resgatado a tempo pela avó. Nessa mesma época, já narrava rodeios e queria ser locutor de rádio, função que só conseguiu desempenhar três anos depois. “Em um belo dia, chegou à rádio um caminhoneiro que disse que tinha me ouvido e achado muito legal o meu programa. Ele se ofereceu para me dar uma carona até Goiás.” Foi aí, então com 17 anos, que o garoto de Guaimbê traçou a meta mais desafiadora de sua vida: faturar R$ 1 milhão no prazo de dez anos.

Só conseguiria isso, é claro, se migrasse para onde prometera tempos antes. E foi o que fez. Aceitou o convite do caminhoneiro – que morreu há quatro anos e de quem se tornou grande amigo –, contou seu plano para ele durante o trajeto e tratou de hospedar-se na casa de um tio, onde teoricamente passaria as últimas duas semanas das férias. Ficou lá por três meses. Até que o pai foi buscá-lo e o desafiou a arrumar um emprego em uma semana. Para encurtar a história, Anderson conseguiu em uma cidade vizinha, Santa Helena de Goiás, o tão sonhado trabalho em uma rádio, com remuneração de dois salários-mínimos – o que, à época, totalizava R$ 300. E em nenhum momento se esqueceu do sonho milionário, mesmo parecendo impossível para quem ganhava tão pouco. O caminho foi longo, mas ele, contrariando as estatísticas, chegou lá. Teve fé em Deus, na vida e, principalmente, em si.

DEZ ANOS
Durante a década da corrida por R$ 1 milhão, Anderson ficou noivo de uma moça chamada Lady Laura – o pai era fã de Roberto Carlos –, desmanchou o noivado, trocou de emprego algumas vezes, trabalhou como locutor de telemensagens, implementou projeto para atrair munícipes à Câmara de Caçu, trabalhou como assessor de imprensa da prefeita de Mineiros de Goiás, casou-se e conheceu aquele que seria o seu passaporte para a conquista da meta mais ousada: Luan Santana. Antes de ser empresariado por Anderson, o garoto era conhecido apenas por Gurizinho.

No começo, Anderson trabalhava em uma rádio e não deu muita bola para o tal menino. Até que sua ex-mulher ouviu que a prefeita que ele assessorava pretendia contratar o guri para um show. “No dia 2 de novembro de 2007, ele foi à cidade para se apresentar. Era um menino magrinho. Nessa época, ia a família inteira, e eu conheci o seu pai. Comecei a vender os shows dele no Estado de Goiás”, lembra.

O pai de Luan convidou Anderson para ser empresário do garoto. No primeiro ano, o visionário de Guaimbê mudou-se para o Mato Grosso do Sul, mas não obteve lucro com o trabalho. E por que achava que Luan daria certo? “Fazia muito tempo que não via um artista de que as crianças gostassem tanto. Ele tinha uma essência que chamava minha atenção”, justifica. Tanto que, com apenas R$ 120 de saldo bancário e um aluguel de R$ 1.000 para pagar, sua então mulher questionou a determinação em fazer do rapaz um cantor de sucesso. Dizia que histórias como essas só davam certo nos filmes. “Tive de decidir se continuava com o Luan ou com ela. No dia 9 de dezembro de 2008, ela foi embora”, lembra Anderson.
Um ano depois, no entanto, veio a reviravolta: por ironia do destino, a música Meteoro despontou nas paradas de sucesso e Anderson pôde adquirir uma casa avaliada em R$ 1 milhão. Meta cumprida.

Mas como ele é movido a sonhos, empresariar Luan não bastou. Depois de sete anos trabalhando exclusivamente com o garoto de Campo Grande, Anderson quis abrir sua empresa, a A.R. Live, e tentou vender sua parte na sociedade da L.S. Music. Sua decisão não agradou e Luan Santana e Sorocaba, seus sócios, entraram com ação na Justiça. Depois de grande entrave nos tribunais, os parceiros acabaram comprando a parte do empresário pelo valor da primeira oferta. “Eu não estava disposto a ficar só com um artista porque queria criar uma empresa. Não consigo ver as oportunidades passarem na minha frente e eu não pegar. A Galinha Pintadinha passou e eu não pude pegar”, exemplifica, citando também Patati Patatá e a cantora Paula Fernandes.



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