Música para os olhos

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Heloisa Cestari

Neste ano, as salas de concerto europeias entraram em êxtase com a celebração dos 200 anos de nascimento de dois grandes gênios da ópera: o alemão Richard Wagner (1813-1883) e o italiano Giuseppe Verdi (1813-1901). Contemporâneos e rivais, eles nunca se encontraram, mas conheciam as obras um do outro e até hoje dividem as preferências do público e da crítica, em uma eterna disputa entre o rigor épico do tenebroso autor de Tristão e Isolda e o popular romantismo do criador de La Traviata, que ficou furioso por ter sido acusado de se inspirar no estilo do músico germânico ao compor a obra-prima Aida.
Rivalidades à parte, fato é que a trilha sonora do século 19 não seria a mesma sem ambos. Universais e complementares, suas composições atravessaram o tempo como pontos brilhantes da história da música. E se a temporada de comemorações termina agora com um acorde de saudade, os lugares que marcaram as vidas destes dois ícones do drama musicado permanecem imutáveis e atemporais, assim como suas obras. Confira a seguir um roteiro primoroso, traçado pela equipe da Dia-a-Dia, para os amantes de ópera reviverem o lirismo de seus ídolos independentemente de qualquer efeméride.
 
Vida de Wagner foi tão cheia de reviravoltas quanto suas árias épicas. Foto: Shutterstock.
A ALEMANHA DE WAGNER
A vida de Wagner foi tão cheia de reviravoltas quanto suas árias épicas. O ponto de partida da ópera de sua vida é Leipzig, onde o compositor nasceu, na casa número 3 de um quarteirão judeu, em 22 de maio de 1813. Lar de diversos outros artistas de renome, como Bach, Schumann, Mozart, Mendelssohn e Goethe, a cidade respira musicalidade desde 1254, o ano em que documentos mencionam pela primeira vez o Thomanerchor - um dos coros de meninos mais antigos do mundo. 
O tour sonoro começa com visitas à Casa de Ópera (famosa pelo repertório que vai do barroco ao moderno) e à Gewandhaus, sede da orquestra criada em 1743 com o mesmo nome, a Gewandhausorchester. Durante muito tempo, o grupo foi dirigido pelo maestro Kurt Masur, semblante da revolução pacífica de 1989, que culminou na queda do Muro de Berlim. 
Os impressionantes órgãos da casa emitem uma harmonia de sons inesquecível, com 6.638 tubos. Não à toa, Wagner iniciou ali sua jornada pelo caminho dos acordes. Frações de sua complicada história podem ser recontadas na Igreja de São Tomás, venerável instituição musical que já existia desde a época de Bach (1685-1750); e na Universidade de Leipzig, onde o compositor ingressou encorajado pela mãe. O templo religioso luterano pode ser visitado gratuitamente em qualquer dia, das 9h às 18h, mas lembra muito mais a vida de Bach - que trabalhou ali, como maestro de coro, durante 27 anos - do que a de Wagner. Já a instituição de ensino, fundada em 1409, é uma das mais antigas do mundo.
De lá, vale dar uma pausa no passeio para provar os doces de um dos mais antigos cafés da Europa, o Zum Arabischen Coffe Baum, ponto de encontro predileto de moradores, religiosos e grandes personalidades desde sua criação, em 1711. Bach, Schumann, Liszt, Grieg e Wagner eram frequentadores assíduos do estabelecimento. E a lista de visitantes eventuais inclui nomes como Goethe, Lessing, Napoleão e Augusto, o Forte. 
Aproveite o coffee break e suba ao terceiro andar para conferir o acervo do Museu do Café. Distribuídos por 15 salas, mais de 500 objetos expostos contam a história de 300 anos do grão e da cultura na Saxônia. 
Mas se o foco for mesmo a tradição melódica de Leipzig, prefira o Museu de Instrumentos Musicais, que reúne uma das coleções mais importantes do gênero no planeta e que revela fatos curiosos da história sonora de Leipzig, inclusive de Wagner. 
 
DRESDEN
De volta à estrada, acesse a Brandenburger Straße na direção de Dresden, pelas rodovias A4, A17 e B170. O percurso de carro dura cerca de uma hora e meia, e também é possível cumprir o trajeto de trem (passagem a R$ 95, com duração de 1h09) ou de ônibus (R$ 25, 2h04). 
Foi em Dresden, localizada a 116 quilômetros de Leipzig, que Wagner passou a infância com a mãe e o padrasto (o ator e dramaturgo Ludwig Geyer). Também foi nesta cidade que, quase três décadas mais tarde, o músico finalmente estreou Rienzi no Teatro da Corte, com grande sucesso. Logo depois, foi nomeado kapellmeister (diretor artístico e regente) do espaço. Ou seja, uma espécie de ‘rei’ da vida musical na região, com cargo vitalício e salário excelente. 
Passados exatos três anos, em 19 de outubro de 1845, as paredes do mesmo teatro testemunharam a estreia de outra obra-prima de Wagner: Tannhäuser, que foi inteira escrita em Dresden. Mas desta vez a ópera não causou grande furor junto ao público.
Melhor não gastar tanto tempo buscando referências da obra de Wagner na cidade e partir direto para a cereja do bolo: a chuvosa Bayreuth, na Baviera, onde a influência do compositor ultrapassa os limites das notas musicais para ser sentida também nos campos da filosofia, da literatura, das artes visuais e do teatro. De Dresden até ali são mais 231 quilômetros, que podem ser concluídos em aproximadamente duas horas e 15 minutos pelas estradas A4 e A72. 
 
Casa de Ópera de Bayreuth, onde as obras de Wagner são reproduzidas até hoje em festival anual dirigido por seus descendentes. Foto: Shutterstock.
BAYREUTH
A identificação dos moradores de Bayreuth com a obra wagneriana foi tamanha que o músico teve sua própria casa de ópera na cidade, o Bayreuth Festspielhaus, onde foram apresentadas as premières mundiais de O Anel do Nibelungo e Parsifal, e onde suas composições mais importantes continuam a ser produzidas até hoje, em um festival anual dirigido por seus descendentes. 
Na primeira edição do evento, em agosto de 1876, o então imperador do Brasil, Dom Pedro II, fez questão de deslocar-se até Bayreuth para cumprimentar Wagner pessoalmente. Ainda hoje, po


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