Em obras

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Miriam Gimenes

O sociólogo Ricardo Borges Martins defende o voto distrital

Se o Brasil tivesse uma porta de entrada, nela estaria fixada uma placa indicando que estamos ‘em obras’. E não seria uma alusão aos grandes complexos em construção para comportar a Copa do Mundo do próximo ano ou a Olimpíada de 2016. É que o País está há tempos passando por uma ‘reforma’ – uma não, várias –, como aquelas que não terminam por falta de recursos ou mão de obra. Só que, neste caso, a escassez é de vontade. Em pauta? A reforma política.

O tema vira e mexe volta à tona. Desde a Constituição de 1988, Ulisses Guimarães já previa que adaptações teriam de ser feitas. No entra e sai de governo, todos (sem exceção) falaram sobre a necessidade de mudanças. A última foi a presidente Dilma Rousseff (PT), que, pressionada por inúmeras manifestações, teve de dar resposta: “Esse tema todos nós sabemos, já entrou e saiu da pauta do País por várias vezes e é necessário (que) tenhamos a iniciativa de romper o impasse”, admite. No fim de junho, ela anunciou em rede nacional o enviou de um documento ao Congresso propondo plebiscito para discutir cinco pontos.

Entre suas indicações urgentes estão: alteração na forma de financiamento de campanhas; definição do sistema eleitoral; continuidade da suplência no Senado; manutenção das coligações partidárias; e o fim ou não do voto secreto no Parlamento. Assim que a proposta foi entregue, a ‘novela da reforma’ começou.

O historiador Mário Sérgio de Moraes, professor da Faap (Fundação Armando Álvares Penteado), explica que a protelação dessas alterações se dá porque o sistema eleitoral vigente está muito bem arquitetado pelas legendas. Caso ocorra alguma mudança, ‘quebra-se esta engenharia’. E o ponto que deve gerar maior furor entre os legisladores, na sua opinião, é o de financiamento de campanha, em que seria proibido o dinheiro privado. “Se mudar para o fundo público, ficará difícil para as organizações com segundas intenções manipularem os políticos.” Um dos principais argumentos para acabar com o financiamento feito pelas empresas é evitar o toma-lá-dá-cá de benesses – principalmente na forma de licitações – após a eleição.

Agora, se o financiamento tornar-se público, quem pagará a conta? “Possivelmente os nossos impostos. Não veremos como este dinheiro será manipulado. O ‘caixa dois’ (doações ilegais não declaradas à Justiça Eleitoral), neste caso, não está sendo eliminado.” Como o dinheiro seria dividido de acordo com a composição das bancadas na Câmara dos Deputados, apenas os partidos maiores seriam beneficiados, e os menores, condenados ao nanismo.

E este é apenas o primeiro ponto. “O principal obstáculo à reforma política nos últimos anos tem sido a quantidade de propostas que tentam aprovar em um mesmo pacote”, sintetiza o sociólogo e coordenador do movimento #EuVotoDistrital, Ricardo Borges Martins, que fala sobre a reforma a seguir. A única certeza que se pode ter é de que faltará consenso e sobrarão opiniões.

DIA-A-DIA – De que forma acredita que o voto distrital ajudaria na democracia brasileira?
RICARDO BORGES MARTINS – O Brasil vive há anos um deficit de representação e a principal causa desse fenômeno é a distância que existe entre representantes e representados. O voto distrital, enraizado na ideia de democracia de proximidade, representa grande avanço à democracia brasileira, pois estabelece vínculo claro entre a população e seus representantes políticos. A implementação desse sistema, presente nas principais democracias do mundo, é a forma mais eficiente de se garantir controle social sobre as legislaturas e aumentar a autonomia do Legislativo frente ao Executivo.

DIA-A-DIA – Concorda com as outras mudanças propostas pela presidente?
MARTINS – As perguntas me parecem cruciais para a reforma política. Considerando que um dos principais argumentos a favor do voto distrital é justamente o aumento da fiscalização da população sobre os políticos, medidas como o fim do voto secreto no Congresso parecem de bastante interesse.

DIA-A-DIA – Quais pontos propostos pela presidente travarão a votação?
MARTINS – Um dos maiores empecilhos à convocação do plebiscito é a própria ingerência do Executivo em uma pauta que tem efeito exclusivamente sobre o Legislativo. Muitos parlamentares estranham a bandeira da reforma política ter sido levantada como resposta às manifestações de rua, sobretudo porque este tema não estava entre as reivindicações populares mais comuns. À parte disso, o principal obstáculo à Reforma Política nos últimos anos tem sido a quantidade de propostas que tentam aprovar em um mesmo pacote. Se o plebiscito viesse à tona – o que não me parece ser o caso –, o ideal seria analisar uma proposta por vez, posto que cada uma delas tem consequências bastante relevantes sobre o processo político.

DIA-A-DIA – Fala-se em plebiscito ou referendo. O que seria melhor para viabilizar a reforma neste momento?
MARTINS – Qualquer uma das opções passa pelo crivo do Congresso Nacional, isto é, os deputados e senadores serão os arquitetos das perguntas. O perigo de se convocar um plebiscito é, a meu ver, a vaguidade das terminologias. Ou seja: antes de saber se a população é favorável ao ‘financiamento público’ de campanhas, é preciso definir como serão distribuídos os recursos entre os partidos/coligações; de onde virá este dinheiro; quanto será investido, etc. Ir a plebiscito sem esta prévia definição representa um grande risco para a legitimidade desses mecanismos de democracia direta, e é por isso que muitos críticos apontam que um plebiscito poderia ser um ‘cheque em branco’. Neste sentido, um referendo me parece mais apropriado.

DIA-A-DIA – Também foi cogitada a Assembleia Constituinte? O que acha?
MARTINS – Acredito que a convocação, a formação e todo o desenrolar de u



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