Mãe de muitos

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Isadora Almeida

Heloísa Melillo nasceu com um dom: ajudar. E, precoce, com apenas 13 anos de idade decidiu que já era hora de procurar trabalho. Vinda de uma família de classe média alta, esperou os pais saírem de viagem, na época, para ir até uma escola perto de casa e se oferecer para uma vaga de emprego. Assim se tornou auxiliar de classe e anos mais tarde, coincidentemente ou não, formou-se em Pedagogia. Mas a vontade de educar e auxiliar o próximo vêm de longe. Ainda na infância, Heloísa já era voluntária da APAE e AACD.

Cheia de iniciativa, desde pequena sempre procurou traçar metas e ir atrás de seus objetivos, e foi com esse desejo de entender a realidade do outro, que a pedagoga fundou em 1996 o grupo H. Melillo, uma união de empresas e instituições voltadas ao desenvolvimento de cidadãos e comunidades, incentivando a educação, cultura e preservação do meio ambiente, além de campanhas para empresas e o poder público.
 
Heloísa tem só dois filhos biológicos, Felipe, 24, e Amanda, 22, mas leva no coração outros milhares de crianças e jovens que considera como filhos também. Dentro do grupo H. Melillo, um dos projetos sociais mais extraordinários é a Casa de Cultura e Cidadania, uma organização que tem parceria com o Grupo AES Brasil, e que promove formação e lazer para população de baixa renda em todo o país. As ‘casas’, como são intimamente apelidadas, são espaços onde as crianças e jovens têm a oportunidade de voltar a sonhar e acreditar. “Muitos chegam ao projeto sem sonhos, só vivem o ‘aqui e o agora’, e a realidade desse presente é a violência. Precisamos despertar em crianças e jovens o direito de sonhar e o nosso compromisso é ensinar um caminho que lhes permita transformar esse sonho em realidade.” 
 
O projeto conta com sete unidades, sendo seis no Estado de São Paulo - Barra Bonita, Caconde, Lins, Osasco, São José do Rio Pardo e São Paulo na divisa com Diadema - e uma em Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul. O trabalho, segundo a pedagoga, começa através das crianças e dos jovens, mas necessita da participação dos pais, que precisam ser parte ativa neste processo de transformação. “O tempo que passamos com eles é bem menor do que eles passam no grupo da família”, explica Heloísa.
 
Heloísa e as crianças no grupo H. Melillo
 
Além de trabalhos envolvendo a educação dos filhos, a Casa de Cultura e Cidadania oferece cursos ligados a geração de renda e formação profissional. A preocupação é a inserção dessas pessoas no mercado de trabalho. "Esse é o nosso diferencial, não oferecemos um milhão de cursos, mas os que oferecemos já estão amarrados dentro de um processo onde aquelas pessoas já saem praticamente empregadas ou com uma condição e oportunidade de concorrer com chances de vitória dentro do mercado de trabalho", ressalta. 
 
Dentre vários exemplos de sucesso que o grupo possui, um deles foi uma parceria com a empresa Tivit, uma das maiores operadoras de callcenter da América Latina, que realizou um curso de capacitação de operadores. Segundo Heloísa, os aprovados no curso, eram imediatamente convidados a fazerem parte da empresa, com carteira registrada “Eles acabaram se tornando operadores diferenciados.” Outra parceria que deu certo foi com a ANEL - Associação Nacional das Empresas de Lavanderia, onde alunos de comunidades mais carentes aprenderam a lavar, passar e atender ao público.
 
Para Heloísa, se existe uma palavra para definir o que as pessoas e escolas precisam, e essa palavra é gestão. “O maior problema é a falta de gestão. Falta investir na formação de gestores, em estratégias e planejamento. O professor, dentro de uma escola, tem ideia do que é direção, mas não do que é gestão. Cabe ao poder público de educação investir nesse lado”, insiste. 
 
Com relação às empresas que participam dos projetos, a maior dificuldade é fazer enxergar que o investimento vale a pena, mesmo que a longo prazo. “Esses projetos custam caro, mas precisam existir. A gente gasta cem mil reais só com papel higiênico. Além disso, tem que ter conhecimento técnico e não se faz isso com dez reais”, explica. Outro grande desafio é separar empresas que querem investir em desenvolvimento social das que procuram apenas visibilidade. “O joio começou a ser separado do trigo. E as empresas que estiverem aliadas ao trigo terão uma história de inserção junto ao cliente que será um benefício, um ganho”, acrescenta. 
 
Há pouca coisa que Heloísa odeie, mas detesta acordar cedo. Mesmo assim, levanta, porque sabe que todo dia tem um mundo para transformar e pessoas para contagiar. Para ela, a missão das pessoas é deixar este mundo melhor.
 
Trajetória de vida
 
A pedagoga acredita que a missão das pessoas é deixar o mundo melhor
Heloísa já foi militante social e sindical. “Vivi um período de ditadura, então, participei de movimentos. Foi nos partidos políticos e nos sindicatos que eu comecei a aprender”, recorda a pedagoga. Aos 18 anos, Melillo foi diretora da Apeoesp e, aos 23 anos, passou a coordenar o Projeto Ipê - Projeto de Formação de Educadores por Multimeios - que, segundo ela, foi o maior orçamento da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo da época. 
 
Casou-se aos 24 anos e em 1983 foi efetivada em uma escola municipal da periferia de São Paulo e ficou responsável pela pior turma, a H. Naquela época, a turma A era definida pelos melhores alunos e notas, e a H era a última sala, conhecida como “os sem salvação”. Ela conta que, no primeiro dia, assim que adentrou, percebeu que a lousa estava quebrada e não existiam cadeiras inteiras. Além disso, uma carteira foi lançada em sua direção. “Eu olhava para aquelas crianças e pensava no que eu poderia fazer”, revela. Proibida de sair com as crianças da escola, Heloís


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